há qualquer coisa de lágrima numa celebração minha.
se soubesse aceitar a beleza das lágrimas não tinha que [me] explicar a origem delas e podia sorrir com as bochechas molhadas mais vezes sem as rugas.
às vezes uma celebração minha é uma timidez – um dia tenho que conseguir abandonar isso e elevar-me a lesma, gambozino, helibélula. acreditar no fio que o grilo ata às estrelas lá longe no universo vincado de negrume; emprestar a minha pele numa jangada quase a afundar; afastar nuvens que dançam nas peles do mar; soprar uma madrugada pra ela voltar a mim [ainda gostava de ter uma crise de asma por excesso de nuvens nos pulmões respiratórios].
sem ser só nas palavras vividas em poesia, pra mim a morte devia ser um voo dançado por um papagaio-pipa – eu quero ser a aragem desse voar. se morrer um dia vou celebrar a palavra morte com incensos e música cantada por andorinhas – a morte anda por aí à solta e a vida afinal parece é uma máscara...
«a palavra vida é maior que a palavra morte», disse-me o meu sobrinho tchiene hoje que ainda faltam dezasseis dias pra ele nascer.
quando ele chegar ao mundo vou mostrar-lhe uma garça gaga que encontrei num poema e me passou a gaguez dela. eu passei a gaguez toda pra uma tarde e foi bonito ver a tarde esticar-se porque não sabia bem como pronunciar o definitivo pôr-do-sol. a noite ficou extenuada – à espera de chegar.
há qualquer coisa de adélia na palavra fé. talvez porque ela seja uma mulher de palavras pesadas com tanta leveza e saiba cavalgar medos selvagens. há na obra dela manchas leves de infância – essa varicela foi muito manuseada por luuandino [o que viajava com intimidade pelas ruas de antigamente, passando por tetembuatubia, kinaxixi, makulusu, olhos das crianças, pássaros e peixes]. certa noite, no lubango, vi o joão vêncio pendurado numa estrela; ao pé da casa onde sonhei nesse serão havia uma represa que era doadora de ruídos bons – apadrinhados por sapos gordos. espreitei pela janela fechada e quase cometi o erro de olhar um gambozino nos olhos. fechei os olhos e abri a janela, limitei-me a olhar assim as estrelas brilhantes numa ternura interna que eu lembro pouco de frequentar [no lubango a ternura brota em mim sem cerimónias].
às vezes uma chuva molhada é uma coisa boa para escorregar momentos em direcção a mim. quando uma chuva molhada cai sobre o mundo redondo, as coisas da vida e a vida das coisas encontram-se num quintal vasto. foi sob uma chuva molhada em canduras que encontrei as barbas do meu pai num poema e o sorriso da minha mãe noutro. foi nas entrelinhas dum poema ensopado que encontrei, várias vezes, a autorização interna pra falar a palavra amor [vou tentar não apagar isto: eu tenho certo receio da palavra amor, espero só que ela não me tenha receios também; seria triste].
foi com as mãos sujas de restos de amor que estiquei uma madrugada. quando digo a palavra madrugada também sinto um esticão no coração. se agora abuso muito das madrugadas é porque cada uma delas tem restos de amor que eu sempre vou perdendo. qualquer dia acumulo esses restos todos e faço uma construção de amor [talvez chame uma mulher pra se encostar ao outro lado dessa construção]. a palavra amor pode ser um labirinto com mais de catorze lados avessos. depois de esticar uma madrugada encosto a madrugada na minha pele e espero. a pele gosta de ser esculpida de novo muitas vezes na vida.
se puser um «v» na palavra esticar, poderei estivar uma madrugada. aí elevo-me a estivador de madrugadas e posso pensar num caixote com luar, um caixote com geada, caixotes pesados de estrelas, caixotes de nuvens carregadas de pingos, um caixote hermético com lágrimas, uma caixinha de costura com restos concretos de amor.
as palavras são muito bonitas também porque têm significados cicatrizados nelas – falo a palavra kwanza e sou invadido pelas belezas de um rio e o sol todo a bater-lhe nas peles da água escura que ele tem. o rio transporta o barro e os peixes e nunca ninguém se queixou de cócegas. há qualquer coisa de jangada na palavra rio. liberdade seria abraçar um jacaré sem lhe apetecer provar-me. eu queria fazer festinhas na carcaça antiga de um jacaré mas se ele me fizer festinhas magoa-me. vou olhar o jacaré de longe e o rio de perto – provar as minhas mãos nele. a pele do rio tem mais espelho que a minha e que a do jacaré. o céu e o sol gostam de verter reflexos nas peles paradas do rio kwanza e eu gosto de saber isso com os meus olhos atónitos de humidade. ali onde o mar beija o rio a espuma celebra o evento com pássaros que perseguem peixes. assim a poesia seja salobra ou salgada.
seria bonito ver os mangais depositarem raízes num poema meu – era a minha maior alegria fluvial.
há qualquer coisa de sapiência na palavra tristeza. e algumas tristezas não são de espanar – um dia posso descobrir que elas me fazem falta e ter que ir buscá-las na lixeira da catin ton.
vou encher-me de silêncios e imitar as pedras. adormecer entre as pedras pode ser que me contagie delas. depois de conseguir ser pedra vou exercitar o sorriso dessa pedra que eu for. com esse sorriso vou iniciar uma construção...
uma construção pode bem ser o lado avesso de uma certa tristezura.
Ondjaki.
quarta-feira, 13 de maio de 2009
quarta-feira, 6 de maio de 2009
Gambozinos, lesmas e outros de Ondjakem
Vou esperando que esta árvore morra
Para eu poder nascer outra vez.
Ou, pelo menos, nascer num universo de Tom
Onde ela cresça, enfim, sem humanamargura
Inventar um verso cósmico
Ao sorriso delirante desta formiga.
Mas não me quero humano agora
Não somos filhos legítimos desta Terra.
Onde sorris hoje?
Onde a Lesma deixou o rasto?
Quero encontrar-te de novo amigo.
Acho que te posso chamar - amigo!
Afectuoso ser onde me entendo.
Queria numa ligação dessas de rede,
Dessas que a aranha tece,
Perfurar a grandeza de um solo Africano
E tornar a tua língua - a Lisbuanda.
Porque vejo cidades em tudo
O que escreves. . .
Cidades revestidas da Lua – boa.
Nem vou à caça na mais que altiva das noites
Porque me ensinaste, que eles devem reservar sempre
Cores para um futuro obscuro.E seria obsceno eu recriar um lugar de ti
Por mais que me encontre, em tudo o que semeias.
É bom saber do teu gosto pela palavra antigamente.
E ainda mais, saber por ti a nova margem da palavra
A tal domesticada por Guimarães Rosa.
Existe um concentrado de ti no meu mundo
E é por isso…bom de dizer – Ramela.
Mas intimida-me ler-te!
Intimida a raiz do teu lugar.
Onde a poesia se dá às avessas
Onde só o certo parece ter lugar.
Não que a procures…
Mas porque a vejo polida em pedra
Onde habitam Joões…e a tua infância.
E a Rosa dá lugar ao Neto
Para ver crescer o novo.
Mas é também perdida de lógicas…
Onde Drummondeias a Biologia da palavra.
E o que é isso de Miar à Couto?
Sou Sonâmbulo na tua Terra
E contribuo para a indefinição de Ondjakem
Mas deveríamos, todos,
Beber nele um bocadinho.
Onde celebramos o encontro
De musica e poesia.
Onde me encontro na árvore,
Onde sou até Gambuzino.
E nem que os miúdos me encontrem
Vou celebrar para sempre esta toada…
Como querer Onjakear o que há de bom!*
Rodrigo Camelo.
5 de Maio de 2009
* Citação de Djavan na letra (Sina)«Como querer Caetanear o que há de bom»
Para eu poder nascer outra vez.
Ou, pelo menos, nascer num universo de Tom
Onde ela cresça, enfim, sem humanamargura
Inventar um verso cósmico
Ao sorriso delirante desta formiga.
Mas não me quero humano agora
Não somos filhos legítimos desta Terra.
Onde sorris hoje?
Onde a Lesma deixou o rasto?
Quero encontrar-te de novo amigo.
Acho que te posso chamar - amigo!
Afectuoso ser onde me entendo.
Queria numa ligação dessas de rede,
Dessas que a aranha tece,
Perfurar a grandeza de um solo Africano
E tornar a tua língua - a Lisbuanda.
Porque vejo cidades em tudo
O que escreves. . .
Cidades revestidas da Lua – boa.
Nem vou à caça na mais que altiva das noites
Porque me ensinaste, que eles devem reservar sempre
Cores para um futuro obscuro.E seria obsceno eu recriar um lugar de ti
Por mais que me encontre, em tudo o que semeias.
É bom saber do teu gosto pela palavra antigamente.
E ainda mais, saber por ti a nova margem da palavra
A tal domesticada por Guimarães Rosa.
Existe um concentrado de ti no meu mundo
E é por isso…bom de dizer – Ramela.
Mas intimida-me ler-te!
Intimida a raiz do teu lugar.
Onde a poesia se dá às avessas
Onde só o certo parece ter lugar.
Não que a procures…
Mas porque a vejo polida em pedra
Onde habitam Joões…e a tua infância.
E a Rosa dá lugar ao Neto
Para ver crescer o novo.
Mas é também perdida de lógicas…
Onde Drummondeias a Biologia da palavra.
E o que é isso de Miar à Couto?
Sou Sonâmbulo na tua Terra
E contribuo para a indefinição de Ondjakem
Mas deveríamos, todos,
Beber nele um bocadinho.
Onde celebramos o encontro
De musica e poesia.
Onde me encontro na árvore,
Onde sou até Gambuzino.
E nem que os miúdos me encontrem
Vou celebrar para sempre esta toada…
Como querer Onjakear o que há de bom!*
Rodrigo Camelo.
5 de Maio de 2009
* Citação de Djavan na letra (Sina)«Como querer Caetanear o que há de bom»
quinta-feira, 30 de abril de 2009
domingo, 26 de abril de 2009
Filmes Tejo Exibe filme no Indie Lisboa09
1. Sinopse
Pedro (interpretado por Gonçalo Waddington) é um jovem encenador cheio de dúvidas sobre a peça de teatro político que tem nas mãos e a atravessar uma crise pessoal. Para além do questionamento do radicalismo revolucionário que essa peça coloca e que interpela directamente o seu próprio passado familiar, Pedro mostra-se também confuso com as novas responsabilidades e expectativas decorrentes da gravidez da namorada (Joana Seixas). A encenação parece indefinidamente bloqueada até que Pedro faz uma descoberta em casa da avó, que poderá explicar o desaparecimento do seu pai logo após a Revolução dos Cravos. Na caravana em que a família o costumava levar para férias em miúdo, Pedro encontra dois revólveres e vários documentos que lançam uma nova luz sobre tudo o que lhe tinham dito sobre a misteriosa figura do pai. Parte à procura de respostas, deixando todas as responsabilidades imediatas para trás. O filme de Ivo M. Ferreira, que assina aqui a sua segunda longa-metragem, é uma interpelante e rara revisitação ficcional de algumas memórias pós-revolucionárias portuguesas.
2. Datas de Exibição no IndieLisboa’09 e Ficha Técnica do filme
25 Abril, 21:45, Cinema São Jorge, Sala 1
29 Abril, 21:45, Cinema City Classic Alvalade, Sala 3
Ficção, Portugal, 2009, 85', 35mm
Argumento: Ivo M. Ferreira
Fotografia: Pedro Cardeira, Susana Gomes
Música: António Pedro
Som: Vasco Pimentel
Montagem: Rodolfo Wedelles, Sandro Aguilar
Com: Adelaide João, Cândido Ferreira, Gonçalo Waddington, Hugo Tourita, Joana Seixas, Juan Jesus Valverde, Lídia Franco
Produtor: Maria João Mayer
Produção: Filmes do Tejo II
3. Nota do Realizador
Houve, em todas as épocas, homens e mulheres que abdicaram das suas vidas pessoais para se dedicarem à política, para construírem um mundo melhor e mais justo. Tive o privilégio de me cruzar com um ou dois destes seres especiais, por quem sinto um imenso respeito e um grande fascínio.
Sinto, por vezes, boa inveja dos revolucionários da época do fascismo porque eles tinham um inimigo bem claro para combater.
No marasmo em que vivemos, o inimigo é ténue. O maior de todos parece residir dentro de nós. Da minha parte, tento sempre encontrar a melhor forma de o combater.
Durante dezenas de anos, para combater o fascismo, foram necessárias diversas formas de luta e, também, a luta armada. Após o 25 de Abril, quando se procuravam novos caminhos, vários grupos armados foram constituídos com vista a preservar o que alguns militantes de esquerda acreditavam ser o espírito original da revolução. Hoje,
parece-me absurdo, a mim que detesto violência, mas não condeno de modo algum estes processos em absoluto e, por isso, trato-os com respeito. Foram actos de coragem. Talvez até um dia, voltem a fazer sentido.
ÁGUAS MIL é a voz dos “filhos da revolução” exigindo à geração dos pais que contem o que se passou na História recente de Portugal, quando o País e o Mundo
transbordavam de ideias que caíram antes de se erguerem.
4. Biografia do Realizador
Nascido em Portugal em pleno rescaldo da revolução de 1974 e no seio de uma família de artistas politicamente activa, Ivo Marques Ferreira esteve desde sempre em contacto com o teatro e o cinema.
Iniciando a sua formação técnica e artística em Lisboa, trabalhando como fotógrafo, actor, produtor, encenador e “light designer”, Ivo segue para uma breve passagem na London International Film School, e na Universidade de Budapeste e chega finalmente à China, destino que marcará para sempre a sua vida pessoal e profissional: monta uma pequena produtora em Macau e realiza o seu primeiro filme (e recebe os primeiros prémios). De volta a Portugal, a convite da Exposição Universal de 1998, realiza uma também premiada curta-metragem e pouco tempo depois, dirige a sua primeira longa-metragem. Em 2006 recebe uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian para um curso de Escrita de Argumento leccionado pela L.I.F.S., o que o levou a lançar-se na escrita, e realização, daquele que é até agora o seu projecto mais pessoal: “Águas Mil”.
Recentemente, acabou de ser pai e concluiu o documentário “Go with the Wind”, que o levou novamente à China, desta vez para abordar o tema da emigração.
in: Blog:Crónicas das Horas Perdidas
domingo, 19 de abril de 2009
Bob Dylan - I'll keep it with mine.

You will search, babe,
At any cost.
But how long, babe,
Can you search for what's not lost?
Ev'rybody will help you,
Some people are very kind.
But if I can save you any time,
Come on, give it to me,
I'll keep it with mine.
I can't help it
If you might think I'm odd,
If I say I'm not loving you for what you are
But for what you're not.
Everybody will help you
Discover what you set out to find.
But if I can save you any time,
Come on, give it to me,
I'll keep it with mine.
The train leaves
At half past ten,
But it'll be back tomorrow,
Same time again.
The conductor he's weary,
He's still stuck on the line.
But if I can save you any time,
Come on, give it to me,
I'll keep it with mine.
sexta-feira, 10 de abril de 2009
Verde, Anil, Amarelo, Cor de Rosa e Carvão



Porque me apaixonei de novo por ela!
Verde, Anil, Amarelo, Cor de Rosa e Carvão (EMI – 1994)
Por: Tiago Pereira da Silva
Ao terceiro disco, Marisa Monte encontra, definitivamente, o seu espaço e lugar cativo na lista das grandes figuras da música popular da América, a que chamamos portuguesa. Marisa chegou a considerar na época que: "Meu disco é o menos industrial e techno possível. Tem um som rústico, brasileirissímo...tudo dentro de um conceito musical mais denso, mais coeso, em relação aos meus trabalhos anteriores. Porque quanto mais brasileiro for, mais internacional ele vai ser", portanto, debruçando-se claramente sobre as suas raízes.
Verde, Anil, Amarelo, Cor de Rosa e Carvão (1994). É impossível resistir-lhe depois de uma cuidada audição. Eu próprio, que escrevo agora sobre ele, “ignorei-o” durante anos e anos a fio. Posso dizer que o ouvi, quase dez anos após o seu lançamento. É sinal, pelo menos para mim, de que resistiu, como clássico que deve ser considerado, ás irremediáveis vicissitudes do tempo. Aliás o tempo e a distância são, consideravelmente necessários, para avaliar com algum determinismo o tempo e lugar de um disco na história da música.
Logo aos primeiros acordes de “Maria de Verdade” - de Carlinhos Brown, percebemos estar na presença de algo diferente, embora familiar. O ecoar da sua voz (Marisa Monte) aos primeiros acordes, fazem desta música a parelha perfeita do universo iniciado (muito por força destas gravações) Marisa – Carlinhos. Destaque para o mais do que original “bolo alimentar percussionista”, de dois dos maiores expoentes brasileiros deste ofício, exactamente Carlinhos Brown e Marcos Suzano. A música que fez e que continua a fazer - Marisa de Verdade.
Em “Ao meu Redor” é por demais evidente a sua estilização poética no canto. E em “Segue o Seco”, definitivamente, uma de suas grandes obras, novamente a interpretação mais do que perfeita do universo baiano (sem h) de Carlinhos Brown. Aqui, tudo é incrivelmente doce, tudo é incrivelmente brasileiro. Desse Brasil inevitável e felizmente negro. Escusado será dizer que seus companheiros no “projecto” - Tribalistas, Carlinhos e Arnaldo Antunes vinham trabalhando nos discos de Marisa à anos a fio, pelo menos, desde o contemplado da crónica de hoje.
Tudo lhe sai bem em Verde, Anil , até a cover da música de Lou Reed, “Pale Blue Eyes”, aqui num arranjo completamente diferente do original, que lhe permite afirmar-se como cantora além fronteiras. Não é por acaso que Marisa Monte é a cantora Brasileira na actualidade, de maior sucesso nos EUA. “Em dezanove anos de carreira, Marisa vendeu mais de nove milhões de discos no Brasil e no exterior.
Marisa é considerada pela revista Rolling Stones Brasil, uma das mais notáveis revistas do mundo no segmento de música, como a maior cantora do Brasil, posto este antes ocupado por Elis Regina”.
Se existe recurso estético (presente neste disco) que ultrapassa grandemente a fronteira do tempo, essa é, seguramente, transparecida no tema – “Alta Noite” talvez o momento mais comovente do disco, em que Marisa canta as palavras de Arnaldo Antunes com a exactidão da métrica e musicalidade fonética roçando a melancolia, mas o controlo é sublime. “Munida” do consagradíssimo Nana Vasconcelos, percussionista brasileiro, respeitado no mundo todo, este tema é grandioso pela simplicidade de seu canto e pela ternura do abraço-voz-precursão. Para mim, sem precedentes. Estamos a falar de um altíssimo nível de exigência estilo e estética. Aqui a “parada” é alta mesmo e seu produtor Arto Lindsay, apercebendo-se do que tinha em mãos, poliu como quem resigna o corte de um diamante, com um monumental e irrepreensível arranjo de cordas.
Gilberto Gil e alguns dos músicos que trabalhavam com ele nessa época, também estão presentes no disco “Dança da Solidão” para só dar um exemplo. O som é por demais brasileiro. A qualidade é tão e somente evidente. E em “Bem Leve”, tema que poderia muito bem ter aberto o disco, Marisa Monte e seus pares demonstram mais uma vez, porque Verde, Anil deve constar definitivamente como um dos grandes clássicos de sempre da música brasileira. É que perdoem-me insistir neste ponto, e importa sublinhar que esta senhora já completou 40 anos de vida e o tempo só me trazem esta evidência. Quem souber de um disco feito e co-produzido no Brasil por um Brasileiro, nos anos 90, superior a Verde, Anil que atire a primeira pedra. Disse.
segunda-feira, 6 de abril de 2009
Num Clarão
Versão definitiva
Confesso que não percebi logo!
Ainda hoje permaneço imóvel.
Porque sei que esse alguém
Que te empurrou, vivia dentro e móvel
E sempre, sempre, perigoso
Aparelho insano de sexo preguiçoso.
Vejo tudo agora num clarão
E vejo a clara lua de uma tarde
Que não tarda, faz a noite parecer tua.
E sei que não desprezaste o fim, cobarde,
No verão em que apagaste teu sonho
E teu viver, subindo para um astro medonho
Onde se vê ao longe o teu corpo magro,
Os ossos nus da face e cavos na pele.
Vejo também a tua altura que estreita
Os prédios da cidade, a génese de teu mel
Onde a loucura enterra o deus
E abraça os que não dizem adeus.
Londres afagou-se num misto
De um Brasil de identidade duvidosa,
Ou “Paranás” com rosto de vitrina
Onde reina a quarta divida briosa.
A última, transformaste em dúvida
E as outras três, numa passagem húmida.
E rompe lençóis e armadilhas,
Vem fantasma, sem misticismo
Mas vem ensinar sem o lume do teu fim,
Recuperando desse eterno cismo.
E eu que estava ignorante da morte
Bebendo desse vinho e testando a sorte!
Voas agora numa cidade qualquer
De segunda a qualquer madrugada,
E espero por ti amigo, espero a saudade.
Conheço-te, enfim, Buenos Aires
Lugar do teu começo, livre dos outros
Onde desnasces e crias um outro
Quem gera este asqueroso mundo,
Gera também as lágrimas que cobrem
Teu rosto. E os olhos validam a dor.
Este “poema” perdeu a rima na denúncia
Mas ganha a forma na tua vida
E assim estamos os dois amigo - na lida.
Basta de intimidade!
É fácil ser próximo para essa premissa
Porque os que te julgam temem a ultima palavra.
E lembra-te, julgar é como preguiça
Dá trabalho aprofundar e entender.
Enterra-te, irmão, para veres nascer.
Vejo agora que: ser como tu não é fácil!
Ser teu corpo também não.
Faz tudo o que é preciso
E o que não é preciso, sem vão…
Não que esperes apreço de quem vive
Na ignorância; mas sim, em quem Lorca vive.
Onde mereces estar?
Onde contornas os automóveis em (Mi),
E o belo da vida em (Do). Deixa só
A cidade inteira olhando para ti
Porque és mistério, porque és possibilidade.
Porque so(l) assim és de verdade.
Rodrigo Camelo, Abril de 2009.
Confesso que não percebi logo!
Ainda hoje permaneço imóvel.
Porque sei que esse alguém
Que te empurrou, vivia dentro e móvel
E sempre, sempre, perigoso
Aparelho insano de sexo preguiçoso.
Vejo tudo agora num clarão
E vejo a clara lua de uma tarde
Que não tarda, faz a noite parecer tua.
E sei que não desprezaste o fim, cobarde,
No verão em que apagaste teu sonho
E teu viver, subindo para um astro medonho
Onde se vê ao longe o teu corpo magro,
Os ossos nus da face e cavos na pele.
Vejo também a tua altura que estreita
Os prédios da cidade, a génese de teu mel
Onde a loucura enterra o deus
E abraça os que não dizem adeus.
Londres afagou-se num misto
De um Brasil de identidade duvidosa,
Ou “Paranás” com rosto de vitrina
Onde reina a quarta divida briosa.
A última, transformaste em dúvida
E as outras três, numa passagem húmida.
E rompe lençóis e armadilhas,
Vem fantasma, sem misticismo
Mas vem ensinar sem o lume do teu fim,
Recuperando desse eterno cismo.
E eu que estava ignorante da morte
Bebendo desse vinho e testando a sorte!
Voas agora numa cidade qualquer
De segunda a qualquer madrugada,
E espero por ti amigo, espero a saudade.
Conheço-te, enfim, Buenos Aires
Lugar do teu começo, livre dos outros
Onde desnasces e crias um outro
Quem gera este asqueroso mundo,
Gera também as lágrimas que cobrem
Teu rosto. E os olhos validam a dor.
Este “poema” perdeu a rima na denúncia
Mas ganha a forma na tua vida
E assim estamos os dois amigo - na lida.
Basta de intimidade!
É fácil ser próximo para essa premissa
Porque os que te julgam temem a ultima palavra.
E lembra-te, julgar é como preguiça
Dá trabalho aprofundar e entender.
Enterra-te, irmão, para veres nascer.
Vejo agora que: ser como tu não é fácil!
Ser teu corpo também não.
Faz tudo o que é preciso
E o que não é preciso, sem vão…
Não que esperes apreço de quem vive
Na ignorância; mas sim, em quem Lorca vive.
Onde mereces estar?
Onde contornas os automóveis em (Mi),
E o belo da vida em (Do). Deixa só
A cidade inteira olhando para ti
Porque és mistério, porque és possibilidade.
Porque so(l) assim és de verdade.
Rodrigo Camelo, Abril de 2009.
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