segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Ultimatum:Álvaro de Campos - Novembro de 1917


Publicação original de Ultimatum

Mandado de despejo aos mandarins da Europa! Fora.
Fora tu, Anatole-France, Epicuro de farmacopeia-homeopática, ténia-Jaurès do Ancien-Régime, salada de Renan-Flaubert em louça do século dezassete, falsificada!
Fora tu, Maurice-Barrès, feminista da Acção, Chateaubriand de paredes nuas, alcoviteiro de palco da pátria de cartaz, bolor da Lorena, algibebe dos mortos dos outros, vestindo do seu comércio!
Fora tu, Bourget das almas, lamparineiro das partículas alheias, psicólogo de tampa de brasão, reles snob plebeu, sublinhando a régua de lascas os mandamentos da lei da Igreja!
Fora tu, mercadoria Kipling, homem-prático do verso, imperialista das sucatas, épico para Majuba e Colenso, Empire-Day do calão das fardas, tramp-steamer da baixa imortalidade!
Fora! Fora!
Fora tu, George-Bernard-Shaw, vegetariano do paradoxo, charlatão da sinceridade, tumor frio do ibsenismo, arranjista da intelectualidade inesperada, Kilkenny-Cat de ti próprio, Irish-Melody calvinista com letra da Origem-das-Espécies!
Fora tu, H. G. Wells, ideativo de gesso, saca-rolhas de papelão para a garrafa da Complexidade!
Fora tu, G. K. Chesterton, cristianismo para uso de prestidigitadores, barril de cerveja ao pé do altar, adiposidade da dialéctica cockney com o horror ao sabão influindo na limpeza dos raciocínios!
Fora tu, Yeats da céltica-bruma à roda de poste sem indicações, saco de podres que veio à praia do naufrágio do simbolismo inglês!
Fora! Fora!
Fora tu, Rapagnetta-Annunzio, banalidade em caracteres gregos, «D. Juan em Pathmos» (solo de trombone)!
E tu, Maeterlinck, fogão do Mistério apagado!
E tu Loti, sopa salgada fria!
E finalmente tu, Rostand-tand-tand-tand-tand-tand-tand-tand!
Fora! Fora! Fora!
E se houver outros que faltem, procurem-nos por aí pra um canto!
Tirem isso tudo da minha frente!
Fora com isso tudo! Fora!

Ai! que fazes tu na celebridade, Guilherme-Segundo da Alemanha, canhoto maneta do braço esquerdo, Bismarck sem tampa a estorvar o lume?!
Quem és tu, tu da juba socialista, David-Lloyd-George, bobo de barrete frígio feito de Union Jacks?!
E tu, Venizelos, fatia de Péricles com manteiga, caída no chão de manteiga para baixo?
E tu, qualquer outro, todos os outros, açorda Briand-Dato. Boselli da incompetência ante os factos todos os estadistas pão-de-guerra que datam de muito antes da guerra! Todos! todos! todos! Lixo, cisco, choldra provinciana, safardanagem intelectual!
E todos os chefes de estado, incompetentes ao léu, barris de lixo virados para baixo à porta da Insuficiência da Época!
Tirem isso tudo da minha frente!
Arranjem feixes de palha e ponham-nos a fingir gente que seja outra!
Tudo daqui para fora! Tudo daqui para fora!
Ultimatum a eles todos, e a todos os outros que sejam como eles todos!
Senão querem sair, fiquem e lavem-se.

Falência geral de tudo por causa de todos!
Falência geral de todos por causa de tudo!
Falência dos povos e dos destinos — falência total!
Desfile das nações para o meu Desprezo!
Tu, ambição italiana, cão de colo chamado César!
Tu, «esforço francês», galo depenado com a pele pintada de penas! (Não lhe dêem muita corda senão parte-se!)
Tu, organização britânica, com Kitchener no fundo do mar mesmo desde o princípio da guerra!
(It 's a long, long way to Tipperary and a jolly sight longer way to Berlin!)
Tu, cultura alemã, Esparta podre com azeite de cristismo e vinagre de nietzschização, colmeia de lata, transbordamento imperialóide de servilismo engatado!
Tu, Áustria-súbdita, mistura de sub-raças, batente de porta tipo K!
Tu, Von Bélgica, heróica à força, limpa a mão à parede que foste!
Tu, escravatura russa, Europa de malaios, libertação de mola desoprimida porque se partiu!
Tu, «imperialismo» espanhol, salero em política, com toureiros de sambenito nas almas ao voltar da esquina e qualidades guerreiras enterradas em Marrocos!
Tu, Estados Unidos da América, síntese-bastardia da baixa-Europa, alho da açorda transatlântica nasal do modernismo inestético!
E tu, Portugal-centavos, resto da Monarquia a apodrecer República, extrema-unção-enxovalho da Desgraça, colaboração artificial na guerra com vergonhas naturais em África!
E tu, Brasil, «república irmã», blague de Pedro-Álvares-Cabral, que nem te queria descobrir!
Ponham-me um pano por cima de tudo isso!
Fechem-me isso à chave e deitem a chave fora!
Onde estão os antigos, as forças, os homens, os guias, os guardas?
Vão aos cemitérios, que hoje são só nomes nas lápides!
Agora a filosofia é o ter morrido Fouillée!
Agora a arte é o ter ficado Rodin!
Agora a literatura é Barrès significar!
Agora a crítica é haver bestas que não chamam besta ao Bourget!
Agora a política é a degeneração gordurosa da organização da incompetência!
Agora a religião é o catolicismo militante dos taberneiros da fé, o entusiasmo cozinha-francesa dos Maurras de razão-descascada, é a espectaculite dos pragmatistas cristãos, dos intuicionistas católicos, dos ritualistas nirvânicos, angariadores de anúncios para Deus!
Agora é a guerra, jogo do empurra do lado de cá e jogo de porta do lado de lá!
Sufoco de ter só isto à minha volta!
Deixem-me respirar!
Abram todas as janelas!
Abram mais janelas do que todas as janelas que há no mundo!

domingo, 30 de dezembro de 2007

Génios da Pintura: Cândido Portinari




Talvez o mais importante pintor Brasileiro de todos os tempos, Portinari pintou a realidade de meados do século XX que o envolvia, a dos despossuídos, bestializados, sem chão e sem tecto. Integrando-se tal como os três grandes pintores de murais mexicanos (Rivera, Siqueiros e Orozco) na vanguarda do que viria a ser chamado de corrente Neo-realista, que emergiu em simultâneo em Portugal e Brasil nas suas diversas manifestações (literatura, exemplos disso mesmo são Alves Redol e Manuel da Fonseca; Pintura e Cinema) com um padrão identitário marcadamente da esquerda marxista. O Neo-realismo existiu porque o fascismo era uma evidência.
Confesso que sou um apaixonado do quadro "Os Retirantes" de Portinari de 1944.

Por: Tiago Pereira da Silva

sábado, 29 de dezembro de 2007

Escolha do Dia: Beatrice Ardisson com "Staying Alive" dos Bee Gees

Com um arranjo a roçar a Bossa, esta versão surpreende até o ouvido mais desatento.

Ao Redol do teu Carvalho.

Fazes-me sempre ver
Que quando te alcanço
Quase entendo o avanço
Do teu céu húmido ser.

Representas o que nem sabes.
De uma terna dignidade
Como amparo-paternidade,
Desse alguém, sem herdades.

E quando volto ao lugar de Si
Volto, ao Redol do teu Carvalho.
E aos muitos que, entre ti,
Ainda espreitam nesse orvalho.

Integras mais um irmão
Para essa cultura unir.
Para o templo desse chão,
A estátua-irmã-cinza, esculpir.

Xenofilia a tua língua
Dos teus deuses da criação.
O silêncio, a tua mingua,
Quando da fobia fazes, negação.

Incensurável começo esse,
Desse hospício de enjeitados.
É que os por ti rejeitados
Inflamam cegos, como esse.

Adoptas a incestuosa fé,
Derrubas os montes exactos,
Prendes-te ao eterno pé
Da silva mãe desses matos.

Largas por fim esses gritos
No fumo de cada queimada,
E ao longo desta cruzada
Dançam palavras tuas nos livros.

Por: Tiago Pereira da Silva

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Woody Allen & His New Orleans Jazz Band - "Tie me to your apron strings again"


Woody Allen é um daqueles cineastas que pensa em música 200 horas por dia.
Todos já sabemos da sua paixão suprema pelo jazz, nomeadamente, o "swingado" na primeira metade do século passado. Mas aqui, podemos ouvi-lo a tocar. Nesta versão, Woody Allen e a sua super banda revisitam um clássico, absolutamente sagrado da música negra norte americana.
Para ser naturalmente surpreendido...

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

domingo, 23 de dezembro de 2007

O Menino da Inquietante Coragem

Meu menino…
“Os muros nunca são altos!”
Desafia a lógica e rompe,
Cordas de aço
Desse eterno sistema.
Vê também,
Que seres pequeno
É apenas, uma perspectiva.

Aqui onde me encontro,
Na margem das cores,
Não há lugar para as palavras.
Somos todos herdeiros do silêncio
Não existem controvérsias,
És sempre tu - Mãe natureza.
Ela escolheu-me
E não o contrário.

O improviso recolheu-me,
Na corda e na navalha.
Parecia já preparado,
Para o que adiante constato.
Comprovo chocado
E testemunho o fulgor
Desse interminável
Segundo acto.

Vira ali à esquerda
E quando ameias vires,
Grita o eco
De um Zeca ao ouvido.
Derruba as cercas
Que te fazem sonhar.
Vê te no alto…
E tudo parece brinquedo.

Eu, reencontro o sábio,
A cada leve, a cada passo.
Sua barba, sua mochila,
Contam-me as histórias
Da eterna geração
Que interna meu medo
E dá alta ao templo
Da inquietante coragem.


Tiago Pereira da Silva

Balada do Picoto



Respira um pouco,
Expira mais e mais.
Avisto ao longe a cruz,
Meu pai.
E não há quem
Te siga pra essa Luz.

Subi a árvore mais alta,
Verti cada gota, no tronco
E fiz do animal mais apto,
Minha bússula.
Dos que reúnem toda
A história num acto.

Sobe ao cume, irmão
E deixa-te avistar o lume
Brando da erupção.
O húmido esconde-se
À espreita e faz
Detonar o Carvão.

Abraço ainda a serra
E ajuda-me desta
Peste, João.
Que nós ao cume
Vamos, desta
Vertiginosa emoção.

A ideia de não alcançar-te
Paira em nós
Tão duradoura.
Picoto, pai,
Minha ambição,
De voltas estás…

Sobe, sobe, em
atenção e volta logo,
Para onde, irmão,
Somos filhos,
Das movediças
Almas de intenção.

No turbilhão do fogo,
Contamos mais
O que não falta.
Voa livre e paterno,
Livro voa e fraterno,
E Acende a cruz da malta.

Por: Tiago Pereira da Silva

sábado, 15 de dezembro de 2007

Blur - To The End

Deixemo-nos de complexos. Os Blur foram sem dúvida uma das bandas mais originais dos anos 90 e ponto final. Um exemplo dessa inventividade estéctica ao serviço da música é, a imagem e som deste videoclip, uma homenagem ao filme Last Year at Marienbad. Um daqueles exemplos de que o universo da pop músic sempre andou de mãos dadas com o cinema. Magnífico.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Soneto dos teus lugares

Eu esqueço, sempre, essa ideia
Que reclamas por direito pertencer
Ao teu mundo chão de meia,
Que deveras fazes, por vencer.

Apresentas-me à tua aldeia
E as ruas do teu enaltecer.
O sangue dessa estrada de aveia
Alimenta, o meu envelhecer.

O frio vem desses lugares
Que tu pisaste de dia
Na cegueira dos teus voltares

Faz desse deus, um guia
E aprende, todos os fumares
Desse cachimbo mudo que ouvia.

Tiago Pereira da Silva

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

A fruta de Orfeu

Dormiste em ti tão incubada,
Numa lua triste de Orfeu.
Despiste sempre minha almofada,
Na luz que a Santa ergueu.
Toma teu dia a voar,
Prega Vinicius ao Luar.

Dorme também apertadinha
E leva o pranto na brama.
Chama sempre pela maninha,
Que arrasa e fere esse drama.
Nem que o sol invoque
A cor rosa choque.

Porque elas são todas precisas,
No mar leve de teu ácido.
Nesses esporos, pelas brisas
Perde-se um deserto de ar plácido.
Até que a terra toda seque
E te abrace, como um leque.

Abraçou-se ela também, pintada
Nessa terra que Torga pensou.
É ver-te sempre tão lavrada
Como a fruta que - Eva trincou.
E deu lugar à natureza
Nesse tom de dom braveza.


Tiago Pereira da Silva

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Almost Famous - Tiny Dancer

Em todos os Jardins


Em todos os jardins hei-de florir,
Em todos beberei a lua cheia,
Quando enfim no meu fim eu possuir
Todas as praias onde o mar ondeia.

Um dia serei eu o mar e a areia,
A tudo quanto existe me hei-de unir,
E o meu sangue arrasta em cada veia
Esse abraço que um dia se há-de abrir.

Então receberei no meu desejo
Todo o fogo que habita na floresta
Conhecido por mim como num beijo.

Então serei o ritmo das paisagens,
A secreta abundância dessa festa
Que eu via prometida nas imagens.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Poesia

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Emerson, Lake & Palmer - Fanfare for the common man


Desde miúdo que sou apaixonado por este tema... Estava-se mesmo a ver que não seria um rapaz perfeitamente normal.
Esta banda de rock progressivo - inglesa... desafia todos os elementos estéticos neste hino olímpico reinventado. Na linha do que fizeram os Pink Floyd dos anos 60, os Emerson, Lake & Palmer, tristemente esquecidos pela quase sempre autista - imprensa musical. Na verdade não existiam muitos teclistas como Keith Emerson nos anos 70, como fica claramente demonstrado neste tema, talvez só Jon Lord dos Deep Purple...Só para falar dos mais conhecidos.
Aliás, não existiam muitas bandas comos Emerson, Lake & Palmer.
A música, a partir do 3 minuto parece remeter-nos para um caos Apocalíptico... Nunca ouvi nada igual.
Depois de uma audição - não serão mais os mesmos. Eu ouvi aos 12 anos e nunca mais recuperei do seu impacto.


Tiago Pereira da Silva

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

The Band - The Weight (Last Waltz)

By Martin Scorcese

Township Jive - Ladysmith Black Mambazo

"Chamaram-me cigano" - Zeca Afonso

Chamaram-me um dia
Cigano e maltês
Menino, não és boa rés
Abri uma cova
Na terra mais funda
Fiz dela
A minha sepultura
Entrei numa gruta
Matei um tritão
Mas tive
O diabo na mão

Havia um comboio
Já pronto a largar
E vi
O diabo a tentar
Pedi-lhe um cruzado
Fiquei logo ali
Num leito
De penas dormi
Puseram-me a ferros
Soltaram o cão
Mas tive o diabo na mão
Voltei da charola
de cilha e arnês
Amigo, vem cá
Outra vez
Subi uma escada
Ganhei dinheirama
Senhor D. Fulano Marquês
Perdi na roleta
Ganhei ao gamão
Mas tive
O diabo na mão

Ao dar uma volta
Caí no lancil
E veio
O diabo a ganir
Nadavam piranhas
Na lagoa escura
Tamanhas
Que nunca tal vi
Limpei a viseira
Peguei no arpão
Mas tive

José Afonso

Versões recomendadas: Para além da original do Zeca, Cristina Branco no seu recente "Abril"; Resistência, Filhos da Madrugada...

Lus - Nancy Vieira



(…) O mais original nessa música abençoada desse maravilhoso continente, é que a dada altura, num lugar, num espaço, tudo parece convergir num momento, em que a música e a dança se fundem, como um louvor de alegria, uma bênção, um respirar. Nessa estrada de sonho, os músicos parecem celebrar a música toda do mundo… Celebrar a vida. A música de Nancy Vieira é isso.
“Lus” - conta-nos o que ainda não sabíamos.


Por: Tiago Pereira da Silva

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Eu já tenho - Dave Matthews Band Live Trax. 10 - Lisbon, Portugal


Existem dias difíceis de esquecer e ponto final.

O dia 25 de Maio de 2007 vai ser para sempre lembrado, como uma das mais gratificantes experiências musicais da minha vida. Assistir ao concerto da Dave Matthews Band no Pavilhão Atlântico, foi certamente e apropriadamente inesquecível. Agora, quem quiser recordar o, quase único, concerto de mais de 3 horas desta banda fantástica em Lisboa, já pode fazê-lo. Eu já tenho.

Chamo a vossa atenção para a música “American Baby Intro” nesta versão única, em Lisboa… que privilégio ter assistido aquilo… Sem querer adiantar muito, porque a audição é obrigatória (Play it Loud), com Tom Morello a juntar-se à festa, para aquilo que é talvez a maior virtude desta banda - deliciar os fãs em pequenas jam(s)… Sobretudo Tom e Cárter Beauford parecem desafiar-se em crescendo…A dada altura Carter como a deliciar-se com pequenos solos de percussão, remetendo-nos para uma sonoridade latina: Resultado – um dos melhores momentos que já ouvi da Dave Matthews Band.

domingo, 2 de dezembro de 2007

Maurice Béjart (1927-2007) - A Coreografia da coragem



Na resistência ao Salazarismo, é pouco recordado o papel de estrangeiros como o coreógrafo e bailarino francês Maurice Béjart, agora desaparecido com 80 anos, que no dia 6 de Junho de 1968 ousou desafiar o Estado Novo no Coliseu de Lisboa. Depois da representação de Romeu e Julieta, Béjart, que estava em Portugal a convite da Gulbenkian, referiu-se em palco ao assassínio de Robert Kennedy, ocorrido nesse dia, e acrescentou: «Ele foi vítima da violência e do fascismo. Como todos os que estão aqui esta noite, somos contra as ditaduras… Peço um minuto de silêncio.» O público não fez um minuto de silêncio, mas 20 de aplausos. Na plateia encontravam-se o ministro Franco nogueira e Natália Tomás, filha do «venerando Chefe de Estado». Como consequência, Béjart foi preso pela PIDE e levado de automóvel à fronteira espanhola, onde foi deixado. As relações entre Azeredo Perdigão e o ditador azedaram. Esta é apenas uma das muitas histórias que poderiam ser contadas acerca de um homem corajoso que foi também coreógrafo genial, revolucionador da dança e grande referencia cultural do século XX.


Gonçalo M. Tavares

In: Obituário - Revista Visão

Prosa livre às cartas de alguns leitores de jornais



Inspirado numa entrevista de Chico Buarque, denunciando alguns leitores de jornais brasileiros que reivindicam medidas fascistas, para exterminar os meninos de rua.


Reclamas pelos
“Direitos Humanos”…
Com esse trocadilho infame,
Ousas dizer “humanos direitos”,
A tudo, te propões… orientar.
Da capital ao Senegal,
Retiras a essas aves,
Todas as penas.
Da prisa, ao linchamento,
Sem esquecer claro,
A pena Capital.
Devolves a santa dignidade,
À tua tranquilidade.
E do Caos Urbano,
Fazes um simples Tirano.

Devemos, agradecer-te
Claro!
Sem ti,
Estaríamos infinitivamente,
Mais pobre.
Sabes…
Já é tempo,
De reconhecermos,
O bem que fazes
Para o crescimento,
Desta nação.
“Selecção Artificial”, dirias!
“O mais apto - sobrevive”
Já dizia o outro:
“Ordem para o povo,
Progresso para a Burguesia”.

Mas a cada carta que escreves,
Lembra-te só…Se der, claro!
Enquanto travas nesses,
Intermináveis baseados…
Alimentas esse texto,e,
Quantas mais e mais,
Crianças dessas,
Empurras para esse
Poço sem fundo,
Afogas cada uma
No “Saboroso” e sedutor,
Mundo do crime…

Esqueces também que:
Esses estorvos sociais,
A quem chamas: Vagabundos!
Por te retirarem o direito,
De andares livres na rua,
São esses mesmos,
Que desconsideras, na
Ostentação da tua riqueza.
Considera também…
A possibilidade
De vires de colete
Para as Ruas…
Pois já vives livre
De tudo isso,
Na prisão eterna
De tua casa.

Essa ascensão miraculosa,
Dos que levitam na tua merda,
Só se faz, nessa insistente realidade,
De uma trilogia:
Futebol, Pagode e Tráfico.

Lembra-te também,
Da tua cor…e tua cor...
E já agora,
à noite,
Quando estiveres
Com a esposasinha,
Comandados
Pela novela da Globo.
Vê lá, se encontras,
Nessa programação maldita,
Um taxista, cozinheiro, jardineiro,
Empregado, motorista, etc.
Que seja,
Da tua corzinha…


Rodrigo Camelo

Foto: Sebastião Salgado in Amazónias

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Voas, numa cidade qualquer...

Anjo triangular, que guias!
O Aparelho em que voas,
Num vento forte, que assobias,
Vem disfarçado de armas boas.

Batalha nessa guitarra,
Sábio, o risco de te ganhar,
No fantástico som de farra
Nesse rio-voz, de teu lar.

A tua inocência é viúva
Perdeu o elo da Fanga.
Vós, a eterna miúda
Com beijos escondidos na manga.

Na outra margem, te avisto
De onde os ruídos são manifesto
As causas de tudo isto
De um ser gente – imodesto.

De segunda, a qualquer madrugada,
Espero por ti sem saudade
Porque a ânsia é sempre cruzada,
Como a rima em vão – puberdade.

Aconteceu-me em Sevilha,
Pisar desse céu mergulhado,
Onde assinaste a cartilha,
Um perpétuo fio trilhado.

Conheço-te, enfim, Buenos Aires,
Lugar do teu começo.
Avisto-te, de três andaimes
E compro-te, livre de apreço.

Meu povo de humor quente,
Vens para sempre educado
E eu por mais que tente
Não tenho em mim um soldado

Que lute por ti de dia
E cuspa teu sangue, mais à noite.
Que tem nessa Barcelona, a via
De um ser anjo que a afoite.

Por: Tiago Pereira da Silva

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

SherYl Crow - Dyer Maker

Uma versão da música dos Zeppelin...Quando ela ainda tinha piada.

domingo, 25 de novembro de 2007

We are the world

Vale a pena recordar.. não a música,lol... mas a voz do Boss e sobretudo, de Stevie Wonder, num dos melhores exemplos, do que ele fazia com a voz. Arreepianteee.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Teu Riso!

Riso Teu…

Arrombas as faces,
Quando nem sabes
Que fazes, meu coração
Sussurrar:
“Não deverias, nunca, parar
De sorrir!”

Porque é de todos, o mais
Espontâneo.
Porque é de todos,
O que faz do mais - pouco…
Quando te considero.

Preciso dizer-te
A verdade.
…De te dizer, aliás,
Que sorris a
Minha vontade.

Desenhas teu rosto,
De um lugar que percorri,
De lábios que feri
Com um vulgar desgosto…

Sou cruel até para mim.
Não vejo desse ser,
Esse mesmo fim,
De Um iluminado ver.

Quero embriagar esse riso
Pela manhã eterna da vida.
Quero sempre dessa bebida,
Para subir mais um piso.

Já foste cantada…
Teu riso foi até escrito,
Antes de nascer,
Por todos os poetas descritos.

Que não ousaram,
Como eu, cantar-te…
Que não puderam…
Como eu, amar-te.

És somente para mim!
És loucura de ti
Eu, escravo do teu jardim,
Dessa flor presa por ti.


Rodrigo Camelo

Chico Buarque - Morena de Angola - Carioca

sábado, 17 de novembro de 2007

Grandes Águas (1542)


(…) Não é fácil explicar, pelo menos para mim, a sensação de se estar num lugar, que estou em crer, é único no mundo. Ainda para mais, quando o que vamos escrever é, apenas e só, a recordação de um sentimento presente, mas por preencher. Como explicar? - Talvez se imaginarem um recipiente vazio, possam ter uma ideia do que aqui, de forma tão pouco cuidada tento transmitir. Os contornos desse recipiente, foram marcados pela presença no local e pela sensação única de nascer algo de novo em nós, (já dizia Damásio que a emoção nos conduz ao sentimento e não o contrário). Assim, olho para esse sentimento como o recipiente que perdeu toda a carga emotiva, que carece urgentemente de ser revisitada de quando em vez, para se encher um pouquinho, só. Mas a verdade, é que só no exacto momento do deslumbramento físico, metafísico e emocional, é que encontrei o tal recipiente do sentimento e tão bem guardado dentro mim - cheio. Sobre isso, o tal lugar único para mim, falar-vos-ei mais tarde.(…)

1542

Estava prestes a saltar!
E tu,
A fazer o mesmo…

Reuniste todos os pássaros,
Duas, sete ou cinco - quedas
E enfeitiçaste-me,
Em mil léguas.

Eu sou Nuñez,
O Alvar que te vê,
Virgem e
Jura amar.

Adoptámos teus filhos
Em verde lar.
Nesse eterno breu,
De um rio mar.

Rio - meu,
Desci em tuas termas,
De um Paranaense
Azul sem bermas.

E Ennioiço…

A música circula,
Sempre pelo ar.
Vem dessa falha,
Que a geologia sobe isolar.

Ao rubro dos tambores
Guaranis suave,
Celebramos a união
Da eterna ave.

Pareces desconfiar
De meu sangue.
Que da miséria diária,
Fez de um vulgo, mangue.

Arquitecto da vida,
Que me deste a provar,
Da garganta de um
Diabo a degolar.

Grandes águas,
De um perturbar
Vens do ventre mãe,
Desse Iguazú - olhar.

Um Recipiente chega.
Cinco Contornos vezes,
Quatro líquidos e
Dois meses.

Duas mil partes,
De mim,
Caminham em ti,
Todas as noites.

As outras quatro,
Asseguram voltar.


Por: Tiago Pereira da Silva

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Carta a Francisco Buarque de Hollanda


Nesse caldeirão
De porção mágica,
Mergulhou – Chico,
Ainda menino.
Reinventou tudo!
Palavras emprestadas,
De seu Tio.

Porque desse poço
Bebeu ele, um dia…
Recebendo o poder
Da insígnia, Indefinidamente.
Aurélio, vê-te nele
Obélix,
Como um Druida Panoramix!

Vamos dar a todos
De beber um dia.
A ti meu povo,
O do último grau
Do abandono.
Que vives ao sul
E ao relento…

Porque esse hemisfério
Do norte, que
Para ti - te cospe,
E despreza o esterco,
Com que te lavas,
Sabe da denúncia
E intenção.

Dessas raízes submersas,
Que um pai te
Levou a cantar –
Esses seres alienados
Que choram com
A fímbria da morte
A preparar.

Precisamos todos
Que ele nos cante…
Precisamos todos
De um dia fixo
Para te tornar,
Meu povo,
Um amparo - Ideafix.

Rodrigo Camelo

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Give Peace A Chance - John Lennon

Para a minha amiga Clara!



PS - Só te peço desculpa por uma coisa...É que as novas tecnologias ainda não dão para tirar a Yoko do Vídeo.

The Beatles - I'm Down

Os Beatles em 1965 davam um passo gigantesco, ao tornarem-se a primeira banda do planeta a darem um concerto num estádio de futebol (americano) - 55 mil espectadores.
Percebe-se que as condições eram absolutamente inacreditáveis, quando comparadas com os dias de hoje.
Mas o que acho especial neste concerto e aqui em particular, é que Lennon e Harrison protagonizam um dos momentos mais cómicos de sempre num concerto. Na parte final já nenhum dos dois conseguia cantar de tanto rir... Lennon chega mesmo a tocar piano com os cotovelos. Inacreditável.

Bob Dylan - Tangled up in Blue

Early one mornin' the sun was shinin',
I was layin' in bed
Wond'rin' if she'd changed at all
If her hair was still red.
Her folks they said our lives together
Sure was gonna be rough
They never did like Mama's homemade dress
Papa's bankbook wasn't big enough.
And I was standin' on the side of the road
Rain fallin' on my shoes
Heading out for the East Coast
Lord knows I've paid some dues gettin' through,
Tangled up in blue.

She was married when we first met
Soon to be divorced
I helped her out of a jam, I guess,
But I used a little too much force.
We drove that car as far as we could
Abandoned it out West
Split up on a dark sad night
Both agreeing it was best.
She turned around to look at me
As I was walkin' away
I heard her say over my shoulder,
"We'll meet again someday on the avenue,"
Tangled up in blue.

I had a job in the great north woods
Working as a cook for a spell
But I never did like it all that much
And one day the ax just fell.
So I drifted down to New Orleans
Where I happened to be employed
Workin' for a while on a fishin' boat
Right outside of Delacroix.
But all the while I was alone
The past was close behind,
I seen a lot of women
But she never escaped my mind, and I just grew
Tangled up in blue.

She was workin' in a topless place
And I stopped in for a beer,
I just kept lookin' at the side of her face
In the spotlight so clear.
And later on as the crowd thinned out
I's just about to do the same,
She was standing there in back of my chair
Said to me, "Don't I know your name?"
I muttered somethin' underneath my breath,
She studied the lines on my face.
I must admit I felt a little uneasy
When she bent down to tie the laces of my shoe,
Tangled up in blue.

She lit a burner on the stove and offered me a pipe
"I thought you'd never say hello," she said
"You look like the silent type."
Then she opened up a book of poems
And handed it to me
Written by an Italian poet
From the thirteenth century.
And every one of them words rang true
And glowed like burnin' coal
Pourin' off of every page
Like it was written in my soul from me to you,
Tangled up in blue.

I lived with them on Montague Street
In a basement down the stairs,
There was music in the cafes at night
And revolution in the air.
Then he started into dealing with slaves
And something inside of him died.
She had to sell everything she owned
And froze up inside.
And when finally the bottom fell out
I became withdrawn,
The only thing I knew how to do
Was to keep on keepin' on like a bird that flew,
Tangled up in blue.

So now I'm goin' back again,
I got to get to her somehow.
All the people we used to know
They're an illusion to me now.
Some are mathematicians
Some are carpenter's wives.
Don't know how it all got started,
I don't know what they're doin' with their lives.
But me, I'm still on the road
Headin' for another joint
We always did feel the same,
We just saw it from a different point of view,
Tangled up in blue.



1974 Ram's Horn Music

Dê por onde dê, vou sempre dar a ele...

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Escolha da Semana: Seu Jorge - América do Norte

Nova música, deste extraordinário músico brasileiro.
Não sei exactamente, quando ela é rock, quando é samba ou Funky?
Seu Jorge, é para mim, o grande representante da sua geração no Brasil. Multifacetado musicalmente, acontece que este senhor tem também um timbre de voz invulgar. Belo Claro.
A mais completa tradução da música vinda do interior dos morros no séc. XXI.
Não por sua melodia, ou letra... mas pelo que representa no panorama da música actual. Soa certamente como pop-contemporaneo. Feita com o seu estilo característico de misturar um samba, em rock. A sua voz rouca, chega a ser comovente, no canto de uma letra simples, mas tremendamente eficaz.

Quem já a ouviu, certamente ainda recupera do choque.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Seu Jorge - Carolina

Hoje é dia de Seu Jorge, no Coliseu dos Recreios - Lisboa.
Um dos grandes artistas brasileiros contemporaneos... O negro do negro

domingo, 11 de novembro de 2007

Para acalmar o coração! II Parte

Por: Tiago Pereira da Silva

Ontem, pela primeira vez em anos, senti novamente, a incrível vontade de ser professor. Dar uma aula a crianças desfavorecidas, muitas delas com contornos e trajectórias de vida que jamais poderei vivenciar, ou entender, fazem-nos sentir, mais humanos outra vez. O desapego às necessidades materiais, muitas vezes confundido com imprescindível, levanta questões, necessariamente inconvenientes. Mas já lá vamos.

A corrosiva urgência de afectos, por parte destas crianças, levou-me a relembrar o Brasil e na comovente e extraordinária experiência de privar com crianças das favelas. Cujo o apoio, das chamadas Vilas Olímpicas (responsáveis pela inserção social através do desporto), é muitas vezes, a única oportunidade de vida, ou pelo menos de fugir ao mundo do tráfico.
As crianças que ontem me contaram, inadvertida e sabiamente, que ser solidário, não têm nada que ver com caridade, são uma das mais imediatas e importantes recordações, de uma ainda curta vida, no ensino.

Acalmar o coração de uma criança destas, faz-nos também sentir que, poderíamos todos viver num mundo muito melhor, menos centrado na individualidade, na competição desigual e por isso mesmo, que contribui - forçosamente para elevar ainda mais, as assimetrias sociais. “Perguntemo-nos apenas”: Precisamos mesmo do telemóvel, do MP3, do IPod, etc.” Ou não precisamos todos, urgentemente, de sermos mais felizes? Parece-me a mim, que as imprescindíveis-necessidades materiais, jamais nos levarão a esse fim, que afinal todos perseguimos. Essa é, talvez, a mais transversal procura, de todos os seres humanos.

Contribuir – 0,00000000001% – para tornar uma criança desfavorecida, mais feliz, não é caridade, nem solidariedade, é um dever cívico, uma obrigação moral. Não estamos a fazer nada de mais. Nem nos devemos orgulhar, como se estivéssemos a fazer algo de extraordinário, porque no fundo, não estamos. E é aí, a maior parte das vezes, que reside o problema, de quem ajuda. Parece que procura, um estatuto qualquer. Vou chamar-lhe: imunidade social. Como se depois disso, um individuo, tivesse direito e, portanto, isenção para todas as outras vergonhas produzidas. Por isso, desconfio sempre, de grandes celebridades em projectos de intervenção social, ajudando crianças, aqui e ali. É evidente, e, dir-me-ão vocês, que nem todos serão, farinha do mesmo saco. Certamente que não. Mas importa, colocar à reflexão:
- Não continuarão os que ajudam despretensiosamente, assustadoramente, o seu trabalho (muitas vezes inglório) no silencioso mundo do anonimato?

Música: "Vilarejo" - Marisa Monte

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

marisa monte - diariamente

José Sócrares e Cavaco Silva: Almas gémeas

Quisesse deus, que José Sócrates encontrasse em Cavaco Silva, a sua alma gémea. E encontrou mesmo.
Aqueles senhores estão de acordo em tudo! Até parecem da mesma família politica.
De facto os tempos não estão para brincadeiras e antes de prosseguir, queria interpelar o Sr. Primeiro-ministro de Portugal, com a seguinte questão:
- Sr. Primeiro-ministro, já viu o novo filme de Michael Moore – “Sicko”?
Se não viu, não lhe fazia mal nenhum ver. É que por exemplo na parte Francesa, digamos assim e para nos situarmos, confrontar-se-á com uma realidade, que por mais que lhe custe, é por demais evidente. A produtividade de um país, não necessita de sacrifícios, nem cortes nas “regalias”, aos suspeitos do costume. É até interessante perceber, que para José Sócrates a palavra regalia, ganha um novo significado. Os cortes nas férias, nos feriados, etc. Não podem ser e nunca serão, a justificação para os baixos índices de produtividade de uma nação. Se não veja o exemplo Francês, quando comparado com o Norte-americano.

O apoio do estado à maternidade. Os incentivos, do mesmo, a funcionários públicos com atestado médico. Tudo isto tem estado, também em Portugal, na ordem do dia.
De facto, e, temos que admitir, pela primeira vez em anos, temos um Primeiro-ministro com ideias concretas, com um perfil e uma estratégia de liderança firmes, bem como um rumo para Portugal. Agora, é exactamente aqui, que reside o problema. José Sócrates, não só é teimoso e obstinado, como perigo, oferecendo, este estilo autocrático de “democracia”, à procura de um rumo, diria eu, extremamente arriscado e em algumas matérias, irreversível. Este pensamento, pseudo-modernista, pró-europeísta de José Sócrates, para mim, confunde-se com uma velha máxima, de grande parte dos ditadores da América-latina: Ordem para o povo e progresso para a burguesia. É que ser ambicioso é uma coisa, ter ideias erradas, desconhecedoras da realidade profunda de um país, é outra, completamente diferente. Ás vezes a ouvir José Sócrates e Cavaco Silva, interrogo-me: “Mas estes senhores, são lideres políticos de que país?”

A imprensa, nas suas múltiplas vertentes, também tem feito a sua parte. Ora, o trabalho de um jornalista tem hoje, um peso, muito semelhante a de uma figura do estado, um politico, dirigente partidário, etc. As pessoas ligam a TV, ouvem as noticias (umas mais indisfarçavelmente manipuladas do que outras) e tomam-nas como - verdade. O sentido crítico das pessoas, está diluído a uma sociedade rápida e de consumo. Quanto mais rápida a pessoa for informada, melhor. O sistema montou um circo, que favorece a ideia, oculta, de que não é necessário muito trabalho intelectual ou questionamento da veracidade e isenção jornalística. Aliás, alguns órgãos de comunicação social, já nem se dão ao trabalho de disfarçar. Parecem uma versão diária, bem ao estilo de Marcelo Rebelo de Sousa, de fazer jornalismo. Fazê-lo idoneamente, dizem eles!

Cito a SIC, porque tem no seu director de informação, Ricardo Costa – o rosto, do não disfarce. No dia da realização, da Cimeira de Lisboa, Ricardo Costa, em directo no jornal da tarde, fazia ver ás pessoas lá em casa, a propósito da Manifestação da CGTP, marcada para a mesma hora da cimeira e que acabariam por estar, “apenas” 200 mil pessoas…Mas dizia ele, para os telespectadores lá em casa, que pensassem duas vezes antes de irem para a manifestação, porque nenhuma central sindical europeia se tinha aliado, ao protesto da CGTP. A resposta e mobilização das pessoas, nessa tarde fizeram-me crer outra vez, nas palavras celebrizadas na voz de Zeca: O Povo é, quem mais ordena!

Continua…

A balança das Cores


Clareia os olhos
Seu poeta duende!
Doente dos efeitos
Drásticos da escrita,
Com os olhos cheios
De cones e bastonetes.
Aliás,
Olhos de um cão
Que vê, branco e preto,
Que não enxerga tudo
Preto no branco.
Eu sou esse,
O poeta
Que não sabe escrever.
O amante
Que não aprendeu amar.

Fez-se homem.
Alguém que diz
O que não sente.
Atenção a todos!
Não sei quando volta
Esse diz que diz
Que não diz…
Espreita agora aí,
Abre a porta
Da imensa ravina.
Vai com fé
E não desatina.
Que não sobram
De teus olhos,
As células vivas
Da testemunha, cor.


Rodrigo Camelo

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Maria Rita Show

Com engano e tudo...

Gato Fedorento: Segurança Social - Incentivo à natalidade

Um dos melhores de sempre...

Para que surja esse dia.

Prólogo Inicial: Aqueles que não estão connosco, são nossos inimigos. Pensamento reinante, de sucessivos presidentes dos EUA.


Ele consome
E ainda
Durante décadas.
E continua…
Abastecido de sua verdade,
Nunca está deliciado.
Esse homem,
Quer do sangue e
Do beber.
Embebido do mal.
Antropófago?
Talvez…não!
É que os, que ele come,
São por certo
De outra espécie.

A tortura é teu reino,
O choro das mulheres
Deusa rotina.
Encaixa-se sempre
À espreita, desse imperador.
Acende e Ascende – fascista!
Maldito sejas,
Em teu realismo.
Teu capital, cruza
Noutra palavra.
Multiplica-a num abismo
E vês crescer o,
Capitalismo.

A fome das crianças,
Teu estorvo.
Não, que te retire a calma,
Nem a pose de
Um ser nojo,
Que és.
Que nos consome,
Que arde o mundo,
Na mais que
Profunda ferida.
Cava e afunda,
Cava e afunda,
Cala para sempre
Esse mundo.

As lágrimas sepultadas,
Nessa areia não achada,
Mar, deram à nossa costa.
Que num grito de alvorada,
Floresce nossa energia.
De todos os
povos latinos-mortos
Essa esperança fez,
Das cinzas molhadas,
Seu emergir.

É que os, por ele,
Silenciados,
Saltam das trevas,
Insubmissos e também,
Prontos a surgir,
Em deuses loucos
Do horror,
Dos que viram de perto,
Aquele aperto de mão -
Terror.
É hora de acabar contigo,
Nasceu esse dia.
Ele disse:
Estou pronto!
E nós:
Que a nossa glória
Seja teu fim.


Continua...


Inspirado no documentário de John Pilger - "The war on democracy" - E em todas as vítimas, directas ou indirectas, por essa América Latina fora, de sucessivas administrações, dos opressores do norte.

Tiago Pereira da Silva

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

A Despercebida Origem do Outro

Eu sou outro
Artigo definido –
O outro.
Não, esse outro,
Noutro qualquer.
Aquele que se vê cego
Em si próprio.
O que tem, o gigantesco carisma.
O que sente e mente à saudade.
Um outro, sim,
Como esse outro sim,
Que é contrário de não,
Bem assente num prisma
Da insígnia de verão.

Sou neto,
Num outro livro descalço,
Que sem roupa
Mente ao Inverno.
A madrugada verte,
O vidente da vontade,
De ser gente diferente,
Para deixar descrito,
O acto da formação.
O outro lado do medo
De um anão entre as gentes,
Que vê e ouve por baixo,
Num ser eco, sem dentes
Por esse rio abaixo.

As ruas acordam,
Com o grito-silêncio,
Desse outro…
Que nasce em mim.
Que cabe e cresce de lado.
Esse sem voz no mundo,
Desse mundo sem nós,
Que não te auxilia no trato
E que culmina num - vós.
Todos, produtos
Dessa intrigante multiplicação,
De uma terra não escolhida,
Na promessa de uma equação.
Reina a origem, despercebida.

Tiago Pereira da Silva

domingo, 28 de outubro de 2007

John Pilger - The War On Democracy

src='http://youtube.com/v/3wvwYl71wEI'/>

Obrigatório. Um dever civíl!
Trabalho documental do jornalista Australiano que realiza de forma absolutamente despretensiosa, um trabalho, que depois de visto, até percebemos melhor porque tem sido tão ignorado, por essa imprensa fora. Escolhi a parte sobre o Chile, na visão infame de um Allende vencido, mas nunca "derrotado" na memória colectiva, dessa imensa Améria Latina. Ouvir e ver o ex-agente da CIA, a responder à questão, num arrepiante, mas sobretudo arrogante: "de mais uns, ou menos uns, mortos como se de baratas ou ratazanas se tratassem... é por demais arrepiante. E que todas aquelas mortes foram ou são justificadas... Revoltante.
John Pilger, assina um documento, mais do que obrigatório para todo o tipo de mentalidades. Inegavelmente, não reina na sua obra documental, a cena-circo dos Michael Moore(s) da actualidade.
Sobretudo, para quem acredita, que existem outras formas politicas ao serviço do povo e não servindo-se dele. Mas também, para quem acredita que nasce nas pessoas, pelo exemplo da América Latina, uma reposta ao Capitalismo.

sábado, 27 de outubro de 2007

Mariza - Chuva

Maravilhosa interpretação da música de Mafalda Veiga. A interpretação que me fez descobrir o universo Mariza...

Gilberto Gil - Refavela (1977)

Prólogo Inicial:
Refavela, como Refazenda um signo poético
Refavela, arte sob trópicos de Câncer e de Capricórnio.
Refavela, vila / abrigo das migrações forçadas pela caravela.
Refavela, como Luís Melodia
Etnias em rotação na velocidade da cidade/nação.
Não o jeca mas o Zeca total.
Refavela, aldeia de cantores, músicos e dançarinos pretos, brancos e mestiços.
O povo chocolate e mel.
Refavela, a franqueza do poeta; o que ele revela, o que ele fala, o que ele vê.


Por: Tiago Pereira da Silva

“Iaiá, Kiriê, Kiriê, iaiá…A refavela, revela aquela, que desce o morro e vem transar, O ambiente, Efervescente, de uma cidade a cintilar” … Aos primeiros acordes de uma linguagem musical pejada, de uma outra, recorrente de um português genuinamente Afro-Brasileiro, desse quotidiano pobre e paradoxalmente - feliz, apercebemo-nos de estarmos na presença de algo completamente diferente no panorama musical do Brasil. É como se Gilberto Gil tivesse feito (“apenas”), até esse afortunado ano de 1977, discos preparatórios para a sua obra-prima absoluta. Bem sei que não poderemos esquecer, o seu magistral trabalho em Refazenda de 1975, nem tão pouco ignorar, muito pelo contrário, a era Tropicalista e subsequente, mas em Refavela, a parada é alta mesmo.

O álbum terá começado a germinar no final do ano de 1976, quando Gil e Caetano foram convidados para participar no 2º FESTAC – Festival Mundial de Arte e Cultura Negra – que teve lugar em Janeiro de 1977 em Lagos na Nigéria. Gil, entusiasmadíssimo, reuniu uma super banda para a ocasião. “Refavela” começaria por isso, em seu estado embrionário. O peso da sonoridade e instrumentalização em “Refavela” não são de todo, mais uma incursão de um músico Brasileiro na descoberta de suas raízes Africanas. De modo nenhum. Este é o disco de um músico, que se sente com um pé em cada continente.

Já no final do tema-título, quando Gilberto Gil vai numa direcção musical e o Background vocal, noutra, alcançamos definitivamente, o conceito absoluto de melodia estética. Eu nunca ouvi um coro assim. O Disco tinha apenas começado. Seguem-se pérolas como “Aqui e Agora”, “No norte da Saudade”, sua versão muito pessoal de “Samba do Avião” e as incríveis - “Balafon” e “Patuscada de Gandhi” as mais africanas do álbum.

Escolhi escrever sobre “Sandra” - a faixa seis do disco e uma das minhas músicas preferidas de Gil. No ano da génese do álbum – 1976, Gilberto Gil fora preso em Florianópolis, aquando da digressão dos “Doces Bárbaros”, por posse de maconha. Sandra, sua mulher na época, aparece quase omnipresente na canção. Escrita parcialmente no sanatório onde Gil foi internado, por ordem da justiça brasileira, as enfermeiras do sanatório, aqui, transformadas em personagens, vão se cruzando na canção, como que princesas de sonho esquizofrénico. Se o compasso é fortemente marcado pela batida do violão de Gil, o baixo de Moacyr de Albuquerque (um dos melhores da época), introduz e induz pequenas revelações em “Sandra”. O solo de Sax e o piano de Cidinho, revelam a sonoridade dos afrorismos da época, ou não fosse ela, a do funk e dos movimentos Black Rio. Já para não falar da bateria de um Sr. Chamado Paulinho Braga, baterista de eleição de Elis Regina, que Tom Jobim reconheceu, como um dos melhores do mundo do seu tempo. Encontramos também o coro de Ronaldo Boys e isso é, sem palavras.

Já algumas vezes reconhecida, não as suficientes, nunca é demais enobrecer o trabalho magistral da escrita de Gilberto Gil. Com elevadíssimos níveis de suscitação poética. Talvez, não ao nível dos dois mestres da escrita de sua geração - Caetano e Chico, como o próprio deve reconhecer sem enigma. Mas importa sublinhar aquilo em que Gil é, ou pelo menos foi, mestre. E este eterno menino negro de olhos curiosos, além de transpirar música por todos os poros, joga muitíssimo bem com as vastíssimas possibilidades desta nossa língua. Formando pontes fonéticas de alto teor linguístico e só para citar alguns exemplos em Refavela. O já, anteriormente, descrito: “A refavela, revela aquela”; “Entre a favela-inferno e o céu” (…) “De um povo chocolate-e-mel”. Ou, “Do samba duro de marfim, Marfim da costa, de uma Nigéria”, fazendo mais uma alusão perfeita à região da Costa do Marfim.
Continua…

PS – Especialmente… para quem me deu a conhecer este prodigioso disco, numa das mais gratas lembranças recebidas.

O Infindável Corcunda


Desculpe aí Mezinha!
Mas só quando vier…
Quero lançar a rede
Se feliz der…
Apanhar qualquer coisinha.

Desculpem lá, pá!
Mas assim é demais, também…
É que quando lanço a rede vejo,
Que dos males sofridos, vem também
Um qualquer, que me diz vá…

Ao sagrado espaço frio,
De onde aliás,
Não deverias ter saído.
Nem olhes mais para trás,
Segue adiante esse trio.

Se possível for,
No mais que alto partido,
Faz o teu pouso fixo,
Sem osso ruído
E vais ver extinta essa dor,

Vinde tu, sapo, e afunda
Tem sempre algum pivete
Estragando seu Carnaval.
Espera só um Feedback,
E destrói esse infindável corcunda.


Rodrigo Camelo

domingo, 21 de outubro de 2007

"Primo Basílio" - Daniel Filho


• Informações Técnicas
Título no Brasil: Primo Basílio
Título Original: Primo Basílio
País de Origem: Brasil
Gênero: Drama
Classificação etária: 16 anos
Tempo de Duração: 100 minutos
Ano de Lançamento: 2007
Estréia no Brasil: 10/08/2007
Site Oficial: http://www.primobasilio.com.br
Estúdio/Distrib.: Buena Vista
Direção: Daniel Filho

• Elenco
Débora Falabella ... Luísa
Fábio Assunção ... Basílio
Glória Pires ... Juliana
Reynaldo Gianecchini ... Jorge
Simone Spoladore ... Leonor
Laura Cardoso ... Tia Vitoria
Gracindo Júnior ... Castro


Por: Tiago Pereira da Silva
A propósito da “2ª mostra de cinema Brasileiro” a decorrer no São Jorge e que hoje termina, assisti ontem ao filme de Daniel Filho - “Primo Basílio”, baseado no romance do escritor português – “O Primo Basílio” - de Eça de Queirós. O filme foi precedido de uma mesa redonda, que entre os demais convidados, estavam, Glória Pires (a actriz homenageada este ano pela mostra) e Daniel Filho. Ouvir Daniel Filho a falar sobre a obra de Eça, nomeadamente do romance em questão, foi uma aula de literatura portuguesa, como poucas, estou em crer, a que poderemos assistir ao longo da nossa vida. Fantástica viagem pelo mundo, daquele que poderá muito bem ser, o maior responsável pela transformação da nossa língua. Tal e qual, a conhecemos hoje.
A mesa redonda, bem ao jeito de tertúlia, foi pautada com ritmo humorístico dos intervenientes, sobretudo Daniel Filho. Tudo começou com o questionamento, quase despropositado: Quem é que já leu uma obra do Eça ?
ou até, quem identifica o Eça no espaço e no tempo?

Foram estabelecidas, várias comparações com Machado de Assis, é sabido que este último, não morria de amores por Eça, apesar de ser também reconhecida a sua profunda admiração pelo seu universo, enquanto escritor.
Também foi levantada a questão, ou no Brasil quem conhece Machado de Assis?
O ponto alto do debate, foi a explicação de Daniel Filho, da sua proposta cinematográfica de adaptar o mais importante romancista português, numa obra até um pouco incompreendida, convergindo com um estilo “teatral” do enormíssimo dramaturgo brasileiro, Nelson Rodrigues. Nada mais ousado, diria ele, arrecadando um misto de aplausos e gargalhadas. Sem querer ofender as obras de um e de outro, Daniel Filho, convergindo a conversa para o perigoso mundo das adaptações cinematográficas de romances de autores não-vivos, o realizador, actor, produtor e guionista, explicou de forma sucinta que não há nada mais errado, do que entrar para um filme esperando uma reprodução detalhada do livro. Devo dizer, se me permitem, que não poderia estar mais de acordo. Deu até, um exemplo engraçado do sucedido, num festival de cinema na índia: “Certa vez num festival de cinema, numa palestra com o realizador americano de um filme, após o visionamento do mesmo, alguém na plateia invocou – mas veja bem, o sr. … retirou esta parte e esta e mais esta do livro. Ao que o realizador americano respondeu – Não, não é verdade. Se o Sr. For comprar o livro a uma livraria, vai ver que o livro está lá todo. risos”
Resposta brilhante, devo acrescentar.

Sobre o filme.
Tenho de confessar, que entrei na sala 1 do São Jorge, aliás repleta, com a expectativa nos píncaros, depois de ouvir, tantos e tão rasgados elogios à obra de Daniel Filho, o “Primo Basílio”, em particular. Para este 2º romance de Eça, do já longínquo ano de 1878, em que o romancista fazia o espelho da futilidade reinante na sociedade lisboeta do séc. XIX, atacando directamente a classe burguesa, Daniel Filho opta cuidadosa e inteligentemente por encaixar ou transferir a história, para o Brasil do séc. XX, mais concretamente a cidade de São Paulo no ano de 1958. Vivia-se uma época áurea em alguns aspectos. Foi a época do arquitecto Óscar Niemeyer, responsável pela projecção e desenvolvimento de uma nova capital chamada Brasília. Daniel Filho é atento à transversalidade e versatilidade do romance de Eça, e, faz desta adaptação, uma das mais bem conseguidas que vi no cinema, em anos. De facto, o filme está embebido de uma condução e ritmo narrativo, que associado ao fantástico trabalho dos actores, excepção feita talvez do esforçado, mas incapaz, Reynaldo Gianecchini, como Jorge. Perdoem-me as fãs! Pode ser galã, mas não consigo gostar de um trabalho deste simpático e esforçado actor, mas muito aquém do que exige a sua personagem. Ainda para mais, na exigente tarefa de interpretar o “cornudo” (risos).

O “Primo Basílio” é dos poucos filmes que até hoje, e, após sair da sala, provocou-me um mau estar perturbante. Os minutos vão decorrendo, o espectador vai ficando desconfortável, na sua cadeira e não sabe exactamente porquê. Ontem, apercebi-me do incómodo feroz, das duas pessoas, que tinha sentadas ao meu lado e que eram, completamente desconhecidas para mim. Esse desconforto, vem também, de uma convergência plena entre o plano cinematográfico de Daniel e literário de Eça, como por exemplo, a descrição detalhada das personagens. Permitam-me uma vez mais, sendo no caso do cinema, uma tarefa muitíssimo mais difícil.

Ouvindo e vendo ontem, a afinidade e cumplicidade entre Glória Pires (Juliana) e o Director (como se diz no Brasil) Daniel Filho, percebe-se com grande ajuda do filme, o dificílimo compromisso de tornar Glória Pires numa Juliana credível. Aliás, a actriz dizia ontem que, seu medo de parecer feia, era muito inferior ao medo, de parecer igual a Marília Perâ (um de seus ídolos) que já havia feito a adaptação, para a mini-série brasileira em 1988. Ao que Daniel Filho interrompe, dizendo qualquer coisa do género: “Marília não quis ir até ao fim mesmo, você vai-me prometer que vai ficar feia mesmo”.

Esta referência à parte, à a actriz Glória Pires, é não só necessária como justa. Sendo um imenso admirador da actriz Marília Perâ e não tendo assistido à mini-série, claro que fico sempre algo reticente. Não se deve comparar textualmente duas grandes actrizes que fazem em épocas diferentes um mesmo personagem, seria tão ridículo como comparar um livro e um filme. Quero apenas dizer… que: desde a 1ªcena, em que aparece Glória Pires no filme, o desconforto do telespectador vai-se ampliando e ampliando. É simplesmente sublime o trabalho da dupla, Pires-Filho. A actriz vai aparecendo sempre aos poucos, como que uma aparição, um fantasma, revelando-se a cada apontamento, a cada maneirismo, muito feia mesmo. Incrivelmente bem conseguido. Mérito brutal da actriz, mas obviamente, o caso típico de uma grande Direcção de Actores.

Uma nota também para dizer, que o Brasil é provavelmente o país do mundo, onde melhor se filmam, as cenas de sexo e erotismo. Para eles é uma escola natural. Sexo é vida. E eles são mestres a filmar o nosso quotidiano. Daniel Filho fez, duas das cenas, mais arrebatadoras de erotismo, que vi num filme até hoje.

sábado, 20 de outubro de 2007

O Rio desses duzentos mil...

Nesse rio,
Lanço-me, alerta!
Vejo o pavor de meu tio
Tenho a cabeça deserta

Lanço só meu corpo,
Lanço-me mais vezes,
Lanço me quase morto,
Lanço-me todas as vezes…

As piranhas que com gozo olham,
Jubilam, pelo ser gente-inoperância;
Do meu destino fatal, molham
E afogam, a nossa militância.

O Milton, contou–nos do Milagre
Dos peixes, um dia…
Eu quero fazer, do milagre
Da multiplicação, este dia.

As piranhas estão, para ficar!
Para baixo não olham, se der,
Não é assim, sua visão a vibrar,
Contra a agonia dos povos, sequer.

Erro já, de formação
Somos nós os culpados até,
Desta, tamanha, programação,
Que alimentámos com fé.

Eu encontro mais peixes,
Com eles ajudo, a reunir.
Fugimos todos à espreita
De um lugar seguro, dormir.

Quero ver meus pés,
Muito além, desse rio fundo.
Preciso mais de uns dez,
Desses peixes tigres do mundo…

As piranhas são zelosas,
Têm tudo preparado,
Suas propagandas maldosas,
Deixa-me seco e apertado.

Mas…
Faz do nosso ser seco, molhado.
Desse rio húmido, preciso,
Da urgência, Prestes, o mirrado
E dessa força, o que for preciso.

Junta-te a nós, voz de outros, mil
Vezes, duzentos desses, Camarada
Que Desse rio terrível senil,
Trago-te à tona, essa escumalha.

Rodrigo Camelo

domingo, 14 de outubro de 2007

São Paulo - Rio: Por Inês Pedrosa

(...) Condensa o melhor da cultura brasileira - a música e a literatura. Nesta definição de literatura incluo também o ensaio, que o Brasil - como país novo e destemido que é - cultiva (e publica) muitíssimo mais do que Portugal. Estudos recentes demonstraram que a inteligência das crianças musicalmente instruídas se desenvolve muito mais do que a das que não são - e, no entanto, a música continua a ser desprezada, no nosso país. É também por isso que Portugal é uma país emperrado -e o Brasil consegue dançar, com uma delicadeza infinita, sobre todos os problemas. (...) Talvez consigamos ver em DVD «Pedrinha de Aruanda», um filme em que Maria Bethânia e Caetano Veloso atravessam a noite, a caminho de Santo Amaro, conversando sobre a infância e sobre a lua de Fernando Pessoa. A Caetano, pelo menos, podemos vê-lo e ouvi-lo agora, nos coliseus de Lisboa e Porto. Um show-aula de letra e música, que nos faz tanta falta.

Por: Inês Pedrosa
In: Crónica Feminina, Única-Expresso

Caetano - Cê veio, para ficar!


Ele avisou-nos, e, há bem pouco tempo, mas ainda houve quem não o levasse muito a sério: “Eu sou eternamente tropicalista”. Então, este concerto, soou-me, como uma atitude inconsciente, para os que vaticinaram o seu fim.

A minha “Transa” com Caetano, já tem uns anos. Talvez poucos, mas inevitavelmente sinápticos. Já vão entender. Devo até acrescentar, antes de começar a história, que era daqueles que à partida, não tinha muita expectativa para este concerto. Fruto até, do que vinha ouvindo sobre a sua digressão, mas sobretudo, pela insatisfação com algumas das últimas coisas que Caetano, tinha feito enquanto musico.

Numa breve história, resumo o que aconteceu. Uma bela tarde, ao chegar a casa, liguei a TV e depois de um insistente “Zapppping”, estacionei vidrado na “Sol music”, canal ainda existente na época (decorria o ano de 1998). Esqueçam tudo, em que se tornou o tema “Sozinho”. E é preciso fazê-lo, realmente, com um certo distanciamento e já agora, despretensiosamente. Agora imaginem-se a ouvir o final da música, pela primeira vez. O engraçado, ou curioso desta história, foi ter-me concentrado, quase exclusivamente, no momento dos aplausos.
Aquela imagem, gravou-se para sempre na minha reminiscência. O figurino, não desconhecido de Caetano Veloso, um homem em plena meia-idade, cabelos brancos, voz docemente envelhecida, provocou, um sentimento de perplexidade na mina pessoa. Remeteu-me para as imensas tardes de uma infância, em que entre, outras coisas, alguém lá em casa ouvia a riquíssima música, do Atlântico sul.
Aquelas rugas, determinantes, de uma imensa expressão no rosto cansado, mas feliz de Caetano, pareciam transportar, uma intensa história de vida. Do som ensurdecedor de uma plateia ao rubro… Vi e ouvi, um homem sentado, depois de guardar seu violão, que com um simples esfregar de mãos nas pernas, ajeitou o cabelo grisalho, muito grisalho mesmo, afastando os braços na direcção do público, com as mãos enunciando o gesto da entrega, seguindo-se o, Amaliamente, eternizado: “Muito obrigado…”. Aquele homem, não o sabia, nem poderia, mas aquele gesto límpido da simplicidade dos que realmente, transcendem na arte e se reconhecem como medíocres, havia criado em mim, inadvertidamente, o maior projecto musical. Um jovem que até então, vivia mergulhado no universo dos Beatles, Stones, Zeppelin e outros monstros do Rock. Mal sabia eu, o duplo sentido desta, recém, descoberta. A ligação perfeita, de dois universos, que para mim na época, não se misturavam.
Esta introdução, necessária, para se perceber que tenho vindo a ler e a ouvir muita coisa, ligada ao universo - Caetano Veloso, tem uma segunda intenção. A de invocar e recordar que também ele, foi e é um grande fã do Neo-Rock inglês.

Caetano Veloso apresentou ontem à noite, no Coliseu dos Recreios, o seu disco mais recente “Multishow Cê - ao vivo”, a digressão do álbum de estúdio de 2006 “Cê”.
Logo nos primeiros sons da batida do baterista Marcelo Callado, percebemos estar na presença de um concerto diferente de Caetano Veloso. E para quem já o viu a fazer de quase tudo, mesmo para esses, o concerto poderá ter suado a fresco, directo, duro, mas surpreendente. Eu, que o acompanho apenas, desde a digressão de “Livro vivo”, já não o ouvia assim, há pelo menos 7 anos. Caetano pulou, dançou, cantou com a energia indisfarçável de um homem, que não nega os 65 anos, mas que paradoxalmente rejuvenesce musicalmente, na sua forma clássica de reinvenção. Ele nunca gostou do monótono...

Para quem imaginava um Caetano, na sua 60ª década de vida, a dedicar-se exclusivamente à herança João Gilbertiana de voz-violão, arrastando-se e desgastando-se na reconstrução de um legado, inegavelmente, importante na música do mundo; para esses, que o imaginavam assim... Desculpem a franqueza, mas enganaram-se redondamente. Aí está ele, camaleonicamente, respondendo aos críticos, que ousaram afirmar (e não foram assim tão poucos), que ele não saberia cantar o rock. Como ele um dia terá dito, que por um acaso, se tornou músico e não, artista-plástico ou cineasta, também vou ousar dizer que Caetano, só por uma partida do destino, não ter-se-á dedicado, exclusivamente, pós-tropicalismo, a ser um cantor rock. Não, que não ache Caetano, o mais importante intérprete vivo, de violão e voz Brasileiro de há muitos anos para cá. E até quem sabe, no mundo. Mas se existe coisa maravilhosa, que este homem nos ensinou, é a da transmissão, de uma insatisfação permanente, na busca de um novo projecto musical, na sua pessoa. Transferível até, para outras esferas da sua vida. Esta Insatisfação, amplamente positiva, e não exactamente, a celebrada por Jagger e os Stones, no eterno “I can´t get no, Satisfaction”, fazem dele, uma matriz cultural, que deveria ser incutida em todos os jovens nas escolas. Só para citar um exemplo.

Mas voltando ao concerto. Quem pretende dedicar-se à música, qualquer que ela seja, teria em Caetano Veloso, um muito bom exemplo de como se constrói um alinhamento musical de um concerto. A inteligência com que Caetano, constrói pontes, mensagens e intertextualidades entre as canções, que escolhe tocar, são demonstrativas, da complexidade de um homem, que se interessa sobre todas as coisas. Não se perdendo na intenção. Nem sendo inconsequente musicalmente.
A incursão de Caetano, fez-se, neste espectáculo, por alguns temas dos mais aclamados discos da sua carreira. Casos de “Nine out of ten” e “You don´t know me” de «Transa», esta última já no «encore», “O homem velho” de «Velo» e “Um Tom” de «Livro», dedicado ao maestro e Jaques Morelenbaum, que como se sabe, foi músico e director musical de Caetano, por mais de 15 anos. Também “Sampa” fez parte do espectáculo, com um arranjo nunca antes visto.Uma das mais belas canções escritas em português, fez-se crua e dura, para um público deveras, já contagiado. Voltando a “Um Tom”, e, voltando porque, foi dos momentos mais belos da noite. Caetano procurou dar, uma sonoridade muito própria, desta magnifica banda de jovens músicos (entre eles, o próprio Caetano), a canções emblemáticas, com arranjos simples de rock, como arrojados, potencializados pela versatilidade de uns jovens Srs. chamados: Pedro Sá (Guitarra e Contrabaixo), Ricardo Dias Gomes (Contrabaixo e teclas) e finalmente, Marcelo Callado (um monstro na bateria).

Mas foi também o concerto de “Como 2 e 2”, ou “Fora da Ordem”, que parece ter feito sentido outra vez, agora que, para mal dos nossos pecados, temos o filho Bush no poder. Aliás, vendo bem, a letra nunca deixou de permanecer actual. Virtude dessa Lupa gigante, que insiste em profetizar o essencial, chamada Caetano Veloso, ou não tivesse dito em 1991: “E o cano da pistola que as crianças mordem, reflectem todas as cores, da cidade que é muito mais bonita, muito mais intensa, do que no cartão postal”. O que mudou desde aí? Ou, a tão proclamada, Nova Ordem Mundial do presidente Bush. Realmente, Cê tem razão, “alguma coisa está fora da ordem”.
Ficou talvez a faltar, (interessantíssima sugestão de uma amiga) a, também, extremamente actual: “Podres Poderes”. Caetano surpreendeu-nos até com, em voz e violão", "Fado de Amália", com a sua visão muito particular do fado. O público rendeu-se claro. Em "Desde que o samba é samba" vimos Marcelo Callado, Ricardo Dias Gomes e até Pedro Sá no acompanhamento, em belos solos instrumentais, sobretudo no particular-bateria.

A reacção do público, foi-se transformando ao longo, das quase duas horas de concerto. Até os mais puritanos, terão resistido enquanto puderam. Lá se terão contentado, com os “Leõezinhos” e “Meninos do rio”. Mas até aí, os músicos se revestiram da imaginação, celebrando novos arranjos, e estabelecendo uma iconográfica versão de “Leãozinho”. Só comparável à de «Fina Estampa ao vivo».
Caetano está vivo e bem vivo. Está jovem e é, seguramente, eternamente tropicalista. Depois de ontem à noite, não restam dúvidas. Caetano é “um tom para todos nós…”.

Por: Tiago Pereira da Silva


PS - Só ficou faltando mesmo, usando um gerúndio bem brasileiro, a música "O Herói".

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

João Bosco - Linha de Passe (1979)



Por: Tiago Pereira da Silva

Numa das últimas entrevistas a Elis Regina, já nos anos 80, podíamos ouvi-la dizer, depois de perguntado (versão - questionário rápido) por Marília Gabriela: Um compositor? - João Bosco.
E é tanto mais importante falar de Elis, quando sabemos, que são pouquíssimos os discos, em que ela homenageou e dedicou integralmente a um compositor, excepção feita, talvez, de António Carlos Jobim, no célebre “Elis & Tom” de 1974. Elis fê-lo, com João Bosco.

1979, foi o ano do lançamento de “Linha de Passe” de João Bosco. Um disco que acima de tudo, confirma João como um dos mais originais, composositores-cantores da história da MPB. Elis “roubou” logo dois temas. Este fascínio da cantora por Bosco, percebe-se a até, no uso de sua linguagem musical. Outrora, tinha amado Gil e Milton, até Caetano, mas tenho para mim que, perdeu-se de amores, pelo génio criativo de João Bosco. O “Bêbado e Equilibrista”, um monumento-hino ao som singular, infectadíssimo por João. “Linha de Passe” deixa, ainda hoje, qualquer plateia ao rubro. “Cobra Criada”, felizmente, regravada por Elis na emblemática abertura do concerto de Montreux, é um bom exemplo, da sua misteriosa consideração temática, no seu processo de criação musical.

Toda a sonoridade do álbum, vastamente superior a tudo, o que outros imitadores de João Bosco, sempre tentaram fazer, consagra ainda mais, músicos participantes, do calibre de João Donato – Piano; Luizão Maia – Baixista de Elis Regina; Wilson das Neves – baterista roubado, posteriormente, por Chico Buarque, entre outros.
Ainda hoje, deliro a ouvir, a interessantíssima brincadeira chamada “Boca de Sapo”. Essa, história maluca de um sapo chamado Honorato, que nem Elis Regina, se atreveu a regravar.

Este sim, é o branco mais negro do Brasil… ou será, o negro mais branco do Brasil? Fica à consideração do leitor.


PS - Não se percebe, como tanta qualidade, possa ser sempre, ignorada. Nunca ouvi uma música de João Bosco, na rádio. Fica o registo.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

domingo, 7 de outubro de 2007

Balada do Picoto


Respira um pouco,
Expira mais e mais.
Avisto ao longe a cruz,
Meu pai.
E não há quem
Te siga, pra essa Luz.

Subi a árvore mais alta,
Verti, cada pingo no tronco
E fiz do animal mais apto,
Minha bússula.
Dos que reúnem toda
A história num acto.

Sobe ao cume, irmão
E deixa-te, avistar o lume
Brando da erupção.
O húmido esconde-se
À espreita e faz
Detonar o Carvão.

Abraço ainda, a serra
E ajuda-me desta
Peste, João.
Que nós ao cume
Vamos, desta
Vertiginosa emoção.

A ideia de não alcançar-te
Paira em nós
Tão duradoura.
Picoto, pai,
Minha ambição,
De voltas estás…

Sobe, sobe, em
atenção e volta logo,
Para onde, irmão,
Somos filhos,
Das movediças
Almas de intenção.

No turbilhão do fogo,
Contamos mais,
O que não falta.
Voa livre e paterno,
Voa livre e fraterno,
E Acende a cruz da malta.


Por: Tiago Pereira da Silva

"Fados" - Carlos Saura


Por: Tiago Pereira da Silva


Imaginem um filme, que pretende homenagear a bossa-nova no Brasil. Agora concebam o seguinte. Que um cineasta argentino pega na ideia e procura ao longo do mesmo, desenvolver o nascimento dos movimentos de música popular no Brasil, sem subir os morros da cidade do Rio de Janeiro, para compreender a origem do samba-canção. Não percorrer, os bairros boémios como o da Lapa ou Santa Teresa, onde começaram os primeiros movimentos da Bossa-Nova. Fazer aqui e ali, umas alusões necessárias à importantíssima influencia de Heitor Villa-Lobos, em personalidades como, Ary Barroso, Noel Rosa, Pixinguinha, entre outros, que influenciaram irreversivelmente, a geração de Tom, Vinicius e João Gilberto.

Carlos Saura, realizador de “Fados”, conseguiu, um resultado cinematográfico polémico sobre a nossa, maior expressão cultural.
Ao optar, por esta primeira interpelação ao leitor, não quero com isto dizer que, Carlos Saura não terá deambulado pelas ruas de Alfama e Bairro Alto, respirando necessariamente uma das matrizes endémicas do fado. Simplesmente digo, e para quem já viu “Fados”, que Carlos Saura ousou muito, ao realizar um filme sobre a maior manifestação cultural do país vizinho, sem sequer filmar as ruas de Lisboa (O filme é quase totalmente filmado em Madrid), excepção feita na aparição musical de Carlos do Carmo, em que aparece-nos, como cenário fotodigital, algumas ruas, dessa imensa Lisboa. Esta opção arriscadíssima, já produziu, no seio de alguma critica portuguesa, imensos velhos do Restelo. Da mesma espécie de puritanismo, a que assistimos nos anos 80, quando era frequente ouvir Caetano Veloso cantar “Que estranha forma de vida”, homenageando a influencia que Amália e Portugal tiveram na sua poesia e pessoa, sendo “naturalmente” vaiado por uns e aplaudido por outros.

De facto, Carlos Saura tem uma outra intenção, que pode até não ser devidamente enobrecida por esta nação, vezes a mais, provinciana…Mas o seu eco, já se reflecte um pouco pelo mundo. E não estou a falar dos imensos prémios ou ovações de pé, que arrecadou, em festivais por essa Europa fora.
A proposta cinematográfica de Saura é a de homenagear o Fado, procurando, a criação de pontes culturais da sua possível origem e influencias, casos de África e Brasil. E que bem servidos estamos, devo acrescentar.

Ter como realizador de “Fados” o espanhol Carlos Saura, só poderia resultar na ampliação, da importância multicultural de outros movimentos musicais na nossa música. Aliás, o mais interessante do filme, se me permitem é, justamente, reforçar essa origem histórica, conferindo-lhe uma sonoridade e modernidade, dos nossos dias. É por isso possível ver, em “Fados”, a cantora mexicana Lila Downs, fazer uma das mais belas metamorfoses do fado, que alguma vez vi, conseguidas. Mariza brilha, no canto de fado pró-moçambicano, na reinvenção de “Transparente”, com um quase irreconhecível ou, se quiserem, anónimo, Rui Veloso. Sua guitarra parecia há anos, silenciada. E sobre isso, não é preciso acrescentar, mais nada.

Confesso, que me é difícil falar deste Caetano Veloso, do filme. É um misto de evidência do seu envelhecimento, com o reconhecimento de ser (e é seguramente, não me canso de dizer) um dos grandes intérpretes vivos do mundo. O seu “violão” tornou-se ao longo dos anos mais terno. E sua voz, hoje, sem o alcance de outrora, surpreende-nos, numa “re-re-invenção”, do seu “Que estranha forma de Vida” em jeito de falsete. Um dos grandes momentos do filme.
Ver novamente Chico Buarque, associado a imagens da revolução não é inteiramente novo. É até, para algum público português, um pouco previsível na sequência lógica, das imagens a preto e branco (as cores que ele tanto gosta) da revolução dos cravos, com um “Grândola Vila Morena” a preceder uma nova versão de “Fado Tropical”, com Júlio Pereira no Bandolim. Sem a força interpretativa de Caetano, Chico arrepia nas suas incursões lusófonas do ser português, mesmo quando o texto associado às imagens, parecem inexplicavelmente erradas: - “Quando as minhas mãos estão ocupadas em matar, trucidar, esganar(…). É um Chico velho e magro, que nos aparece nas imagens, mas o azul sedento de seus olhos, nunca defraudou a curiosidade atenta, de ser, um dos poetas maiores da nossa língua.

O “Rap do Marceneiro” deverá surpreender, até, os mais cépticos. Uma lindíssima homenagem a Alfredo Marceneiro. Mas a Brigada Victor Jara, no seu “Fado Bailado” é um dos momentos mais altos do filme; bem como a ponte de junção do Flamenco e Fado.
Carlos Saura, realizador de “Flamenco (1995)” e “Tango (1997)”, inventou um novo estilo cinematográfico. A ligação do género - musical, com o documental, criando ainda sensação no público, e, reconhecimento, na inclusão na Dança, através de um sem número, de coreografias.

Embora, a “nossa” música saia, imensamente prestigiada do resultado final de “Fados”, devo acrescentar também, que a sua obsessão coreográfica no filme, quanto a mim, peca por isso mesmo, por excessiva e muitas vezes descontextualizada. Dando a sensação, de que o possível resultado coreográfico, poderia ser bem melhor.
Frustra um pouco, ver quase “esquecidos”, alguns dos poetas maiores do nosso fado, com escassas referências documentais.
O tema “Amália” seria sempre tratado, de forma redutora, mas também Carlos Saura, deverá saber disso. Sendo uma cantora singular do séc. XX.
Eu, como mero espectador, apenas lamento não ter visto uma referência ao mestre da guitarra portuguesa, instrumento nobre do fado, Carlos Paredes. Terá sido intencional? Fica por esclarecer. Ou até, uma mais do que merecida referência aos Fados de Coimbra. E porque não também, no canto ímpar, de Zeca Afonso homenagear os dois.

De qualquer forma, o resultado é profundamente feliz. Por cá, continuamos a assistir cineastas, a desgastarem-se com “corrupções”… De facto, o maior reflexo, de que nem para nós, somos bons. Importando os formatos americanos Hollywoodescos, para desenvolver produtos descartáveis, que caem no esquecimento. Depois queixam-se do provincianismo. Será que estamos dispostos a exigir um outro tipo de produto? Porque se cozinharmos e alimentarmos este sistema, a “merda”, perdoem-me a expressão, será para sempre, uma coisa natural.



PS – Este é um filme que poderá muito bem aproximar, as gerações mais nova do Fado. Senão tivesse mais mérito nenhum, pelo menos este, já ficaríamos a dever a um Sr. Espanhol chamado, Carlos Saura.

sábado, 6 de outubro de 2007

Rubrica: Escolha do dia - Chamaram-me Cigano


CHAMARAM-ME CIGANO
(José Afonso)

Chamaram-me um dia
Cigano e maltês
Menino, não és boa rês
Abri uma cova
Na terra mais funda
Fiz dela
A minha sepultura
Entrei numa gruta
Matei um tritão
Mas tive
O diabo na mão

Havia um comboio
Já pronto a largar
E vi
O diabo a tentar
Pedi-lhe um cruzado
Fiquei logo ali
Num leito
De penas dormi
Puseram-me a ferros
Soltaram o cão
Mas tive o diabo na mão

Voltei da charola
de cilha e arnês
Amigo, vem cá
Outra vez
Subi uma escada
Ganhei dinheirama
Senhor D. Fulano Marquês
Perdi na roleta
Ganhei ao gamão
Mas tive
O diabo na mão

Ao dar uma volta
Caí no lancil
E veio
O diabo a ganir
Nadavam piranhas
Na lagoa escura
Tamanhas
Que nunca tal vi
Limpei a viseira
Peguei no arpão
Mas tive
O diabo na mão

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

O (om) do Brasil…

É Tão bom,
E...

Tá tudo certo,
Bem depressa e se dá bem,
Com tudo aberto,
Tem também,
Você não vai ficar,
No tom…

Lugar cabreiro,
Despe logo, e minha casca,
De um morteiro
Vede logo, essa tasca,
Você só quer saber
Do bom…

Veado em cima,
Tudo pode, me brotar
Lugar de Lima,
Mas deixa a mim, falar
E pede para embalar
No som…

E dou permisso,
Rio apagado,
Mil e um enguiço,
Tudo afagado,
Mas pede para ficar…
No dom…

Não sobra nada,
Rainha quer teimar
Com, Tv ligada,
Vê lá não vá queimar,
E…
É tão bom!


Rodrigo Camelo

Joao Bosco

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Durmo em ti... Amazónia!

PESAROSO SENTIDO

Chego a este lugar medonho,
Que de tão belo, se faz outro.
Cai-me dentro dos olhos,
Cega-me e atinge-te,
Enfeitiça-nos apenas,
E num abismo, se faz noite.

Quem ousa enfrentar,
Essa mãe natureza?
E esse velho rio vigoroso?
Enterro a melhor parte,
Do meu coração desejoso,
Nesta copa teia emprestada.
E colho por isso, o dever,
Da testemunha que permanece,
Fiel e seguidora
Que pesaroso sentido.

Da copa das árvores,
Vejo o que não atinjo,
Aventuro-me de ramo em ramo,
De Lima em lima, te pego.
Que a dor que trago comigo,
Prove da beleza que enxergo,
Estou de olhar-ouvido, atónito.
Mas não acordo essa árvore.

Inventem-me, um outro sentido!
Preciso de vir preparado,
Que Seja, lúcido também,
Inventem-me, outro dia,
Pois não estou programado,
Da Lúcia musa serpente,
Sabe ao que vim, detalhado.

É tão perto de mim,
O que ao longe avisto,
É Perfeita e bela,
O seio dela.

Como na confusão,
Que me encontro.
E belo também é o caos,
Não há quem suporte o calmo,
Que do seu mundo monótono,
Não nos oferece a alma.

As feras multiplicam-se de dia,
Mas devoram-se, mais à noite.
É tão previsível, essa tua
Impiedosa natureza.
Tua marca duradoura,
Teu desprezo por nós, revoltante,
Mas eternamente necessário.
Ela não cresce,
Apenas acontece,
Livre e sã, deliberada.

Enquanto recupero da dose,
Mais, que da tua altiva pose,
Os meus inimigos alimentam-te,
E dão-me da eterna miséria.

Todos estamos reunidos,
Ao teu redor uma língua certa,
Por onde circula o ar e
Esses micos, a navegar.

Pé ante pé, suspensos na vida,
A serpente reaparece nua,
Senhora do reino
A única que mata e
Não deixa rasto.

Que animal é tão perfeito?
Nenhum outro,
Se conhece assim,
Nem o pesaroso sentido.


Rodrigo Camelo

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Durão Barroso e o Ensino Burguês

Genial... Resumindo e baralhando .. não se percebe nada.

sábado, 29 de setembro de 2007

London, London - Caetano Veloso by Cibelle

I'm wandering round and round nowhere to go
I'm lonely in London London is lovely you
I cross the streets without fear
Everybody keeps the way clear
I know I know no one here to say hello
I know they keep the way clear
I am lonely in London without fear
I'm wandering round and round nowhere to go
Oh sunday, monday, autumn pass by me
And people hurry on so pacefully
A group approaches a policeman
He seems so pleased to please them
It's good at least to live and I agree
He seems so plkeased at least
And It's so good to live in peace and
Sunday, monday, years and I agree
I choice no face to look at
Choice n way
I just happen to be there
And It's oK
Green grass blue eyes
Gray sky God Bless silent peine
And happiness
I came around to say eyes
While my eyes
Go looking for flying saucers in the sky
While my eyes
Go looking for flying saucers in the sky