domingo, 21 de outubro de 2007

"Primo Basílio" - Daniel Filho


• Informações Técnicas
Título no Brasil: Primo Basílio
Título Original: Primo Basílio
País de Origem: Brasil
Gênero: Drama
Classificação etária: 16 anos
Tempo de Duração: 100 minutos
Ano de Lançamento: 2007
Estréia no Brasil: 10/08/2007
Site Oficial: http://www.primobasilio.com.br
Estúdio/Distrib.: Buena Vista
Direção: Daniel Filho

• Elenco
Débora Falabella ... Luísa
Fábio Assunção ... Basílio
Glória Pires ... Juliana
Reynaldo Gianecchini ... Jorge
Simone Spoladore ... Leonor
Laura Cardoso ... Tia Vitoria
Gracindo Júnior ... Castro


Por: Tiago Pereira da Silva
A propósito da “2ª mostra de cinema Brasileiro” a decorrer no São Jorge e que hoje termina, assisti ontem ao filme de Daniel Filho - “Primo Basílio”, baseado no romance do escritor português – “O Primo Basílio” - de Eça de Queirós. O filme foi precedido de uma mesa redonda, que entre os demais convidados, estavam, Glória Pires (a actriz homenageada este ano pela mostra) e Daniel Filho. Ouvir Daniel Filho a falar sobre a obra de Eça, nomeadamente do romance em questão, foi uma aula de literatura portuguesa, como poucas, estou em crer, a que poderemos assistir ao longo da nossa vida. Fantástica viagem pelo mundo, daquele que poderá muito bem ser, o maior responsável pela transformação da nossa língua. Tal e qual, a conhecemos hoje.
A mesa redonda, bem ao jeito de tertúlia, foi pautada com ritmo humorístico dos intervenientes, sobretudo Daniel Filho. Tudo começou com o questionamento, quase despropositado: Quem é que já leu uma obra do Eça ?
ou até, quem identifica o Eça no espaço e no tempo?

Foram estabelecidas, várias comparações com Machado de Assis, é sabido que este último, não morria de amores por Eça, apesar de ser também reconhecida a sua profunda admiração pelo seu universo, enquanto escritor.
Também foi levantada a questão, ou no Brasil quem conhece Machado de Assis?
O ponto alto do debate, foi a explicação de Daniel Filho, da sua proposta cinematográfica de adaptar o mais importante romancista português, numa obra até um pouco incompreendida, convergindo com um estilo “teatral” do enormíssimo dramaturgo brasileiro, Nelson Rodrigues. Nada mais ousado, diria ele, arrecadando um misto de aplausos e gargalhadas. Sem querer ofender as obras de um e de outro, Daniel Filho, convergindo a conversa para o perigoso mundo das adaptações cinematográficas de romances de autores não-vivos, o realizador, actor, produtor e guionista, explicou de forma sucinta que não há nada mais errado, do que entrar para um filme esperando uma reprodução detalhada do livro. Devo dizer, se me permitem, que não poderia estar mais de acordo. Deu até, um exemplo engraçado do sucedido, num festival de cinema na índia: “Certa vez num festival de cinema, numa palestra com o realizador americano de um filme, após o visionamento do mesmo, alguém na plateia invocou – mas veja bem, o sr. … retirou esta parte e esta e mais esta do livro. Ao que o realizador americano respondeu – Não, não é verdade. Se o Sr. For comprar o livro a uma livraria, vai ver que o livro está lá todo. risos”
Resposta brilhante, devo acrescentar.

Sobre o filme.
Tenho de confessar, que entrei na sala 1 do São Jorge, aliás repleta, com a expectativa nos píncaros, depois de ouvir, tantos e tão rasgados elogios à obra de Daniel Filho, o “Primo Basílio”, em particular. Para este 2º romance de Eça, do já longínquo ano de 1878, em que o romancista fazia o espelho da futilidade reinante na sociedade lisboeta do séc. XIX, atacando directamente a classe burguesa, Daniel Filho opta cuidadosa e inteligentemente por encaixar ou transferir a história, para o Brasil do séc. XX, mais concretamente a cidade de São Paulo no ano de 1958. Vivia-se uma época áurea em alguns aspectos. Foi a época do arquitecto Óscar Niemeyer, responsável pela projecção e desenvolvimento de uma nova capital chamada Brasília. Daniel Filho é atento à transversalidade e versatilidade do romance de Eça, e, faz desta adaptação, uma das mais bem conseguidas que vi no cinema, em anos. De facto, o filme está embebido de uma condução e ritmo narrativo, que associado ao fantástico trabalho dos actores, excepção feita talvez do esforçado, mas incapaz, Reynaldo Gianecchini, como Jorge. Perdoem-me as fãs! Pode ser galã, mas não consigo gostar de um trabalho deste simpático e esforçado actor, mas muito aquém do que exige a sua personagem. Ainda para mais, na exigente tarefa de interpretar o “cornudo” (risos).

O “Primo Basílio” é dos poucos filmes que até hoje, e, após sair da sala, provocou-me um mau estar perturbante. Os minutos vão decorrendo, o espectador vai ficando desconfortável, na sua cadeira e não sabe exactamente porquê. Ontem, apercebi-me do incómodo feroz, das duas pessoas, que tinha sentadas ao meu lado e que eram, completamente desconhecidas para mim. Esse desconforto, vem também, de uma convergência plena entre o plano cinematográfico de Daniel e literário de Eça, como por exemplo, a descrição detalhada das personagens. Permitam-me uma vez mais, sendo no caso do cinema, uma tarefa muitíssimo mais difícil.

Ouvindo e vendo ontem, a afinidade e cumplicidade entre Glória Pires (Juliana) e o Director (como se diz no Brasil) Daniel Filho, percebe-se com grande ajuda do filme, o dificílimo compromisso de tornar Glória Pires numa Juliana credível. Aliás, a actriz dizia ontem que, seu medo de parecer feia, era muito inferior ao medo, de parecer igual a Marília Perâ (um de seus ídolos) que já havia feito a adaptação, para a mini-série brasileira em 1988. Ao que Daniel Filho interrompe, dizendo qualquer coisa do género: “Marília não quis ir até ao fim mesmo, você vai-me prometer que vai ficar feia mesmo”.

Esta referência à parte, à a actriz Glória Pires, é não só necessária como justa. Sendo um imenso admirador da actriz Marília Perâ e não tendo assistido à mini-série, claro que fico sempre algo reticente. Não se deve comparar textualmente duas grandes actrizes que fazem em épocas diferentes um mesmo personagem, seria tão ridículo como comparar um livro e um filme. Quero apenas dizer… que: desde a 1ªcena, em que aparece Glória Pires no filme, o desconforto do telespectador vai-se ampliando e ampliando. É simplesmente sublime o trabalho da dupla, Pires-Filho. A actriz vai aparecendo sempre aos poucos, como que uma aparição, um fantasma, revelando-se a cada apontamento, a cada maneirismo, muito feia mesmo. Incrivelmente bem conseguido. Mérito brutal da actriz, mas obviamente, o caso típico de uma grande Direcção de Actores.

Uma nota também para dizer, que o Brasil é provavelmente o país do mundo, onde melhor se filmam, as cenas de sexo e erotismo. Para eles é uma escola natural. Sexo é vida. E eles são mestres a filmar o nosso quotidiano. Daniel Filho fez, duas das cenas, mais arrebatadoras de erotismo, que vi num filme até hoje.

1 comentário:

Anónimo disse...

depois de ler, fico ainda com mais pena de ter perdido o filme...