domingo, 6 de julho de 2008

Poema Cego

Põe a dormir o simples
Aqui, uma lei natural persiste
Todos os sons, uma mais valia
No teu mundo cão que resiste

É escura essa dor!
E escura é também a minha,
Que não mede o singular
Desejo, de um ardor, terminar

Sofres com despretensiosismo
Assim te elevas na moral de tudo,
No estado purpuro da cor
E de toda a merda que for.

Neste mundo louco de cegos
Apresentas-te num outro nível.
Num claro estado d’ transe
Para alcançar o inaudível

E olho-te como se fosses - espelho
É que essa luz negra do medo,
Reflecte, a minha infâmia e cobardia.
Porque nunca me vês. Porque nunca é de dia.

Tuas mãos prolongam-se em poesia
Directa e forte, deliberada.
A que se dá de forma natural
Sob uma formula x - fraternal.

Esse é o prolongamento de teu corpo!
As mãos férteis dos mestres,
E vejo Paredes curvado
Sobre a sua guitarra de prestes,

Ou um Laginha de mãos de clave
Rola, rola, dócil, mil tons,
E de um pequeno sol de enclave
Que olha adiante e acena

Para um irmão de trono - Sassetti
Também eles, vendam, os olhos
Agitam “Meninas e Pianos”
E aconchegam teu espírito, por anos.

Rodrigo Camelo

Carta a Francisco Buarque de Hollanda


Nesse caldeirão
De porção mágica
Mergulhou – Chico
Ainda menino
Reinventou tudo…
Palavras emprestadas
De seu Tio.

Porque desse poço
Bebeu ele um dia…
Recebendo o poder
Da insígnia indefinidamente.
Aurélio, vê-te nele,
Obélix!
Como um Druida Panoramix!

Vamos dar a todos
De beber um dia.
A ti meu povo,
O do último grau
Do abandono.
Que vives ao sul
E ao relento…

Porque esse hemisfério
Do norte, que
Por cima - cospe,
E despreza o esterco
Em que te lavas,
Sabe da denúncia
E intenção.

Dessas raízes submersas,
Que um pai te
Levou a cantar –
Esses seres alienados
Que choram com
A fímbria da morte
A preparar.

Precisamos todos
Que ele nos cante…
Precisamos todos
De um dia fixo
Para te tornar,
Meu povo,
Um amparo - Ideafix.

Rodrigo Camelo

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Do alto dos teus Sobrados


Teu solo-irmão de terra suja
Da bem velha São Salvador
Baía de todas as fontes,
Entranha-se toda em mim.
Ó ser lusitano
Tão indiferente esse teu mundo,
Aos que de ti fizeram a musa prisioneira…
Transbordas de compaixão
Pelas imensas praças
De cores ligeiras e miseráveis,
De tantos azuis e tantos brancos,
De um imenso reino amarelo-claro.

Os teus tupis-iorubás trazem-nos
Tudo à memória…
De uma África-Brasil, Ben Jor.
Dessas imensas africas
Angola, Congo, Benguela
Prontas para ver,
Zumbi chegar.

Contigo estou irmão…
Diante das grandes
Colunas de Pedra,
Dos turísticos pelouros
De uma efervescência cultural
Banalizada ao ritmo dos que pagam
Onde outrora rolou o sangue
De meus irmãos escravos,
Uma eterna sujeira de mãos claras
Que não esqueces, nessa piedosa essência.

Os capitães e jubiabás da eterna infância
Por ti esperaram adormecidos,
Bem como
A tua natureza privada,
A tua mistura grotesca,
A sensual fusão de Alegria e Sexo
Por tua beleza pura, que de tão suja,
Se vê clara.

Ao teor da mãe menininha,
Acrescentas ao teu grei
O mistério e a luz.
Enriqueceste o teu povo sedento
Nas denuncias vermelhas
Do teu mais que Amado rebento
Searas mil e
Ásperos os tempos,
Dos nossos imperadores, mas,
Dos teus templos: A perpetua verdade.

Salvador da Baía


Rodrigo Camelo

Fantasia Apurada

Não me prometeste o destino
Apuras-me a poesia,
E estudo-te, como se de fantasia tratasse,
Que brilho é esse de Gávea?
Ou de elemento neutro de pátria.
Zélia és tu, e eu devasso-te
E sinto a tua sede
Corre louca pelo ar
Que me procura,
Que me procura.
Come meu tronco
E ramos da minha existência,
Come tudo em mim!
Até ficares saciada.
Pára de fingir
Alimenta-te simplesmente…

Não desperdices essa vontade.
Aprende-te, e convoca todos
Os teus sentidos
Até os que ainda, não chegaram.

Nesse mediterrâneo te encontro,
A tua cabeça dança ao acaso
A sorte vem dessa força
A que chamamos vontade.

Não desistas de tentar ser,
Só eu te descubro de facto
Porque estou, deveras, programado
Para fazer do novo o acaso.

Rouba todo o meu fluido
Toma-o como teu
Confunde-o com o teu transpirar
Mergulha toda em ti… Iara,
Suplica pelo meu respirar.

Eu atinjo tudo
E subo alto,
Bem alto onde,
Não enxergo mais teu olhar,
De deusa boto amazónica.

Quero por ti esperar,
Para enfim colidir nas lonas.
Escorre todo o teu líquido
Na minha boca sedenta
Que de ti precisa
E que espera e espera,
Mas improvisa.


Rodrigo Camelo

O homem velho (II Parte)

Quando fores convidado a ouvir a história
E entenderes dos teus dois mil e um – perdão!
Criaste a cena-circo e mataste o menino ser…
Que alimentavas de quando a quando,
Com um pouquinho da tua vontade.
Quando surgiste iniciaste, em mim, o engenho
Com arte, não te limitaste a ligar a alma,
Mas a tece-la, peça por peça.
A destruir pareces fascinado!
Iluminado que estavas da tua razão
Mas esse fundamento matou-te
Sempre um pouco,
Porque te impede de veres os outros,
Que como tu… são feitos
De efeitos que são,
De defeitos…Perdão!
Morreste um pouco eu sei
Porque sou filho da tua magia,
Da que guardaste pacientemente.
Queimaste e torturaste até ficar saciado,
Derramaste todo o álcool no meu pranto,
Enxugas mágoas,
De um passado nunca perdido,
Mas nunca encontrado.
És convidado a ler…
E eu, a ouvir perdão!•

Rodrigo Camelo

Bolero da minha infância



Arranca de Bolero em Bolero,
Tudo o que para trás ficou.
Desprende-te da continuidade de Ravel e
Percebe que a confusão é, também ela, clara.
Como a água que destila deste corpo suado
Que afoga cada poro e a cada pólo.
Alavanca em alavanca, começas a desbravar caminho
Para o universo ao teu redor.
Com a impetuosidade de uma vida
Tentas abranger em ti
A cada braço, a cada gesto
O que está noutro plano
O que está above you
O que ainda não consegues enxergar.

Vês-te num labirinto de espelhos
Em que te encontras cerrado.
E neste eco de imagens
Vasas de uma dor dilatante.
A orquestra é inteiramente tua
Replicas-te em mil e uma vozes
Em cem mil corpos e questões.
Apêndices tornam o teu imaginário razão
A razão, do teu inteiro ser.
Fechas, por fim, a cópula.
De pétala em pétala e
Não permites mais que do teu mundo
Ouçamos essa voz transcendental.

Rodrigo Camelo

Roberta Flack - Angelitos Negros


Pintor nacido en mi tierra
Con el pincel extranjero
Pintor que sigues el rumbo
De tantos pintores viejos

Aunque la virgen sea blanca
Píntale angelitos negros
Que también se van al cielo
Todos los negritos buenos

Pintor si pintas con amor
Por qué desprecias su color?
Si sabes que en el cielo
También los quiere Dios

Pintor de santos alcoba
Si tienes alma en el cuerpo
Por qué al pintar en tus cuadros
Te olvidaste de los negros

Siempre que pintas iglesias
Pintas angelitos bellos
Pero nunca te acordaste
De pintar un ángel negro


Já agora, importa ouvir também a versão que Cat Power fez nas sessões de Jukebox