Por: Tiago Pereira da Silva
Inauguro aqui neste espaço a Rubrica, acima descrita, em que vou procurar ser fiel ao auto-compromisso de deixar todos os dias uma Sugestão Musical. E acreditem não vais ser fácil. Uma musica que por uma razão ou por outra, acordou na minha cabeça. Talvez com vontade de revelar partes que até então permaneciam ocultas.
E que maneira melhor de começar de que com o mano Caetano! A musica Haiti é um dos exemplos do brilhantismo poético deste poeta-compositor brasileiro. Aqui as palavras são mesmo, segundo o próprio, mais faladas do que cantadas. Uma das letras mais politizadas dos anos 90 de Caetano Veloso, uma das maiores incursões do artista pelo mundo do rap contemporâneo. O nosso Pedro Abrunhosa chegou a dizer que é uma das suas letras preferidas de Caetano. É um espelho social. Foi o primeiro artista no Brasil a manifestar-se contra a barbarie ocorrida na prisão de Carandiru.
111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos(...)
Com letra de Caetano e musica de Gilberto Gil e Caetano Veloso, sugiro a versão do concerto Fina Estampa ao vivo. Que poderão encontrar no Youtube que encontrarão escrevendo simplesmente: Caetano Veloso - Haiti
Haiti
Caetano Veloso
Composição: Caetano Veloso e Gilberto Gil
Caetano Veloso
Composição: Caetano Veloso e Gilberto Gil
Quando você for convidado pra subir no adro
Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretosSó pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados
E não importa se os olhos do mundo inteiro
Possam estar por um momento voltados para o largo
Onde os escravos eram castigados
E hoje um batuque um batuque
Com a pureza de meninos uniformizados de escola secundária
Em dia de parada
E a grandeza épica de um povo em formação
Nos atrai, nos deslumbra e estimula
Não importa nada:
Nem o traço do sobrado
Nem a lente do fantástico,
Nem o disco de Paul Simon
Ninguém, ninguém é cidadão
Se você for a festa do pelô, e se você não for
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui
E na TV se você vir um deputado em pânico mal dissimulado
Diante de qualquer, mas qualquer mesmo, qualquer, qualquer
Plano de educação que pareça fácil
Que pareça fácil e rápido
E vá representar uma ameaça de democratização
Do ensino do primeiro grau
E se esse mesmo deputado defender a adoção da pena capital
E o venerável cardeal disser que vê tanto espírito no feto
E nenhum no marginal
E se, ao furar o sinal, o velho sinal vermelho habitual
Notar um homem mijando na esquina da rua sobre um saco
Brilhante de lixo do Leblon
E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo
Diante da chacina
111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos
E quando você for dar uma volta no Caribe
E quando for trepar sem camisinha
E apresentar sua participação inteligente no bloqueio a Cuba
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui
PS - Que torrente de imagens impressionantes que são sugeridas ao longo da canção. Eu atrever-me-ia mesmo a dizer que é uma das letras mais visuais de Cae.
1 comentário:
Boa escolha. Mas deste disco escolheria uma canção menos política e mais romántica: Paloma...muito bem colocada por almodovar em Fale com ela.
bjo
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